Do lado de cá da família, começou
aquela farra e alguém conseguiu uma Van, já que era muita gente, e o povo
sempre bebe mais do que deve, e ninguém quer dirigir nessas situações. Pois é,
a gente é pobre, mas tem juízo.
O problema foi na hora de coçar o
bolso para pagar a condução. Quer dizer, aos trancos, barrancos e chororô, todo
mundo deu a sua parte, isto é, tia Zuleide, sempre ela, disse que já havia
arrumado carona e, por isso, não entraria na vaquinha. Mentira, como ficou
provado na hora do embarque, no sábado bem cedo. A muquirana, ainda por cima,
veio com aquela conversinha.
— Minha gente, como já tá
pago, e tô vendo que tá sobrando lugar vazio, vou aproveitar a companhia de
vocês até a festa.
A parentada trocou olhares, mas ninguém
teve coragem de falar alguma coisa, ainda mais porque quem podia com tia
Zuleide já partiu dessa para melhor. Seja como for, bastou o motorista dar
partida para que o pagode rolasse solto até o sítio, onde a outra parte da
família já estava se divertindo.
De tão boa estava a festança, nem
parecia confraternização da minha família. Não vi imbróglios dignos de menção,
a não ser os costumeiros porres de tio Alberto e vovó Lucinha. Bom mesmo foi a
seleção de sambas, apesar da insistência de dois primos, que passaram uma
temporada em Goiânia, querer meter sertanejo. Foi aí que entrou a autoridade de
tia Almerinda, que disse que nem sobre o seu cadáver aceitaria tamanha
desfeita.
Salvo o bom gosto musical, o churrasco e a cerveja desceram
que é uma beleza. Todo mundo ficou satisfeito ou, como gosta de dizer mainha,
triste diante de tanta fartura. Mas eis que, já no final do dia, precisávamos
retornar e, então, todos meteram as mãos no bolso para pagar o motorista da Van
por conta da volta. Quer dizer, tia Zuleide, sempre ela, disse que descolara
uma carona com um primo metido a rico, que foi o único a ir de carro próprio.
Ninguém acreditou, mas, dessa vez, era mesmo verdade.
Tia Zuleide, no banco do carona, ainda acenou para todos
nós assim que o automóvel partiu. De tão bêbados que estávamos, não tivemos nem
ânimo para mandar nossa parenta para aquele lugar. Mal entramos na Van, cada um
foi buscar seu canto e, não tardou, era possível ouvir roncos em vários tons,
alguns até desafinados.
Nem me dei conta de quanto tempo passou até que a Van parou,
o que despertou um ou outro parente. Logo a gritaria começou e, então, percebi
o motivo. Era o tal primo e tia Zuleide, que estavam no meio do caminho. O
motivo? A gasolina havia acabado. Pra quê? Foi aquela zoação!
Alguém até pensou em dar suporte para a dupla, mas logo
desistiu. Que se virassem, mesmo porque havia um posto de gasolina a uns dois
quilômetros para trás. Sei que foi maldade, mas deu aquela sensação gostosa de
vingança ver tia Zuleide e o primo metido a besta caminhar em direção ao posto
para comprar gasolina.
- Momento Cultural: O conto "Tia Zuleide, a muquirana" foi publicado por Notibras no dia 17/3/2025.
- https://www.notibras.com/site/tia-zuleide-a-muquirana-paga-para-ir-a-farra-de-uma-forma-ou-de-outra/
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