Lucimara, mulher arguta e de pavio curto, sabia como poucas
enfrentar o que fosse para atingir seus objetivos e, principalmente, manter
suas conquistas. Quase sempre sincera, não poupava dissimulações quando
necessário. Se o dia a dia era uma batalha, a vida precisava ser encarada como
uma guerra, onde os fracos não têm vez, como gostava de dizer após assistir a um
famoso filme protagonizado por Javier Bardem.
Foi solteira até se casar com Juliano, união que iniciou em
princípio de janeiro, mas que não chegou à primavera. Cada um para o seu canto
e, até onde consta, não guardaram rancores além dos necessários. Tanto é que,
vez ou outra, não precisam fingir que não se viram quando se esbarram, seja em
um restaurante, seja na fila do supermercado ou, até, em alguma festa de
amigos.
Gente civilizada é outro nível, talvez você possa imaginar.
Não diria que esteja por completo enganado, mas não se engane com a calmaria na
superfície, ainda mais quando a turbidez da água se faz mestra em esconder o
que está nas profundezas. Lucimara sabia muito bem camuflar rancores, e Juliano
não passava de um bobalhão, como todos os demais de sua frágil espécie. Ele, é
provável, nem se dava conta do que estava por detrás do sorriso sarcástico da
ex-esposa e, por isso mesmo, nem desconfiava do desfiladeiro sem fim de
insultos que lhe era dirigido.
Camila e Marco, casal conhecido de Lucimara e Juliano, não se
cansavam de comentar o fim do término do relacionamento do que, imaginavam, ser
o par perfeito. Não que tamanha perfeição não passasse de mera suposição de
gente ingênua. Mas vá lá! Imaginemos que tamanho devaneio exista, mesmo que isso
seja algo tão irracional como, por exemplo, acreditar que patrão e empregados
devem ter liberdade para decidirem o que é melhor para ambas as partes. Faz-me
rir!
— Não entendo.
— Não entende o quê, Marco?
— Você e o Juliano.
— Não tô te entendendo.
— Por quê?
— Por que o quê, homem?
— Lucimara, o que o Marco não entende é por
que você e o Juliano terminaram.
— Dê-me paciência, né, Camila?
É verdade que os de fora não têm noção sobre
a realidade vivida por cônjuges, já que, não raro, existe uma grossa cortina
feita de hipocrisia que os impede de tomar ciência sobre o que acontece entre
quatro paredes. Entretanto, não se sabe se por maldade ou ato de bondade de
satisfazer a curiosidade alheia ou, então, um misto de sentimentos, Lucimara
chamou os amigos para perto e, sem papas na língua, murmurou baixinho:
— É segredo, mas vou satisfazer a curiosidade alheia.
O queridinho de vocês irritou a minha alma.
- Nota de esclarecimento: O conto "O ex-casal quase perfeito" foi publicado por Notibras no dia 14/5/2025.
- https://www.notibras.com/site/ex-casal-quase-perfeito-da-asa-norte-segue-enfim-rumos-diferentes/
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