— Ademar, você não
prefere ficar em casa hoje? O Gama vai jogar.
— E eu não sei, mulher?
— Pois, então?
— Pois, então o quê?
— Não é melhor ver o
seu time do coração pela televisão?
— Hum!
— Então?
— Vou ao mercado
comprar cerveja.
— E pra que tá
levando as chaves do carro?
— Hum!
— Ademar, meu amor,
o mercado é aqui em frente.
Não adiantou a esposa
argumentar, pois o homem saiu de carro, deu três voltas pelo quarteirão para
que todos pudessem babar de inveja do novo carrão do morador mais vaidoso da
região. Um Celta usado, é verdade, mas, mesmo assim, um Celta quatro portas,
com vidro fumê e um adesivo da Sociedade Esportiva do Gama, maior agremiação
futebolística do Distrito Federal.
Quer mais? E
você acredita que o Ademar mandou trocar a buzina original por uma de apito de
navio? Não resta dúvida, o gajo era determinado. Tanto é que, a cada buzinada,
acenava para os atônitos transeuntes, que não poupavam comentários.
— Que maluco é
aquele?
— Ah, é o Ademar,
marido da dona Joana.
— O megalomaníaco?
— O próprio.
Ademar, finalmente,
estacionou o possante em frente ao mercado. Desceu lentamente, retirou os
óculos escuros, como se estivesse participando de um filme de Hollywood. O
próprio James Bond. E, antes de entrar no estabelecimento comercial, virou o
rosto para dar mais uma olhada na relíquia de cor vermelha. Deu uma última
olhada ao redor, sorriu e, então, adentrou no recinto.
Diante da
promoção, escolheu a marca mais barata. Uma dúzia de latinhas, além de um quilo
de acém. Afinal, era dia de clássico: Gama x Sobradinho.
Pagou a
conta e, já na calçada, encarou novamente a máquina estacionada. Estufou o
peito, acionou o controle para abrir a porta e, então, entrou no Celta.
Depositou as duas sacolas de plástico sobre o banco do passageiro.
Ajeitou o retrovisor, colocou a chave
na ignição e... Nada! Virou novamente e, para sua surpresa, nem mesmo sinal de
vida do motor.
Ademar,
olhos arregalados, começou a suar frio. Foi aí que constatou que a bateria havia
arriado. Por sorte, dois jovens parrudos que passavam por ali ajudaram a
empurrar o Celta, que pegou no tranco. O motorista acenou para os salvadores da
pátria e, então, tratou de voltar para casa, que ficava do outro lado da
rua.
O
homem preferiu guardar segredo sobre o ocorrido. Não iria dar o braço a torcer
justamente para a esposa. Pelo menos, Ademar estava certo de que o Gama
massacraria o adversário logo mais, coisa que não aconteceu. Foi um magro zero
a zero. Ao menos, a cerveja, mesmo não sendo da marca mais afamada, fez uma
bela dobradinha com a carne preparada na churrasqueira elétrica.
- Nota de esclarecimento: O conto "Ademar, o ostentador" foi publicado por Notibras no dia 7/5/2025.
- https://www.notibras.com/site/ademar-o-ostentador-faz-inveja-com-o-velho-celta/
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