Minha vida, desde os
meus 13 anos, foi rodar pelo Nordeste. Tudo, na verdade, começou na minha
pequena e encantada Belmonte, litoral da Bahia, onde nasci e me criei correndo
atrás dos guaiamus. Esse tempo de menino, no entanto, findou-se assim que papai
faleceu, e minha mãe precisou dar conta dos filhos, total de cinco, sendo eu o
mais velho.
Fui trabalhar de ajudante de
caminhoneiro e, não tardou, fiz minha primeira viagem para Salvador. De lá para
Recife foi um pulo, até completar todas as oito capitais no litoral nordestino.
Faltava Teresina, que, por conta do trabalho, só fui conhecer há pouco mais de
um ano. E, apesar de não ter ficado por lá além de alguns dias, possuo um
enorme carinho e, melhor, profunda gratidão por aquela cidade. E, se você tiver
um tempinho, sente-se, que vou lhe contar.
Após quase 20 anos na estrada,
consegui comprar um caminhão. E, por conta disso, passei a fazer viagens bem
além do litoral. E eis que, em junho do ano passado, fiz um frete para a
capital do Piauí, onde dormi em um pequeno hotel. Uma noite apenas. Todavia,
foi mais que suficiente para transformar a minha vida, que desde sempre havia
sido um poço de solidão, em um oásis de fartura.
Assim que entrei no hotel, fui
atendido por uma mulher de seus lá 45 anos, idade que regula com a minha.
Trocamos algumas palavras, até que ela me entregou as chaves do quarto. Tomei
um banho e, em seguida, meu estômago clamou por um bom prato de comida. Desci
as escadas. No entanto, para meu azar, não havia nada aberto àquela hora, pois
já era quase uma hora da madrugada. Troquei algumas palavras com a
recepcionista.
— Tá com muita fome?
— Um pouco.
— Se quiser, preparo um
sanduíche pra você.
Não sei se foi a estrada que me
arrancou todo o orgulho, mas aceitei de pronto a oferta daquela mulher, que
disse se chamar Joana. E, enquanto aguardava na recepção, ela foi até a cozinha
do hotel e, em pouco mais de cinco minutos, retornou com um belo sanduíche de
queijo e uma garrafa de suco de acerola.
Agradeci e dei uma boa mordida,
quando pude sentir o quão bom estava aquela refeição, que, àquela hora, me
pareceu um manjar dos deuses. Joana apenas observava, talvez curiosa por saciar
a fome de um faminto naquela madrugada.
— Muito bom, Joana!
— Minha avó me dizia que o
melhor tempero é a fome.
— Está muito bom mesmo!
Após comer, perguntei quanto
era. Joana apenas sorriu e disse que não era nada, que era por conta da casa.
Diante de tamanha generosidade, eu me senti obrigado a ficar por ali
conversando com a minha quase amiga. E, confesso, a conversa foi muito melhor
do que o sanduíche, que, por sinal, estava delicioso.
Fui dormir por volta das três
horas. Acordei próximo ao meio-dia. Tratei de arrumar as coisas e voltar para a
estrada. Passei na recepção para pagar pela hospedagem. Fui atendido por um
rapaz. Agradeci e fui em direção ao meu caminhão, quando percebi que Joana vinha
toda sorridente em minha direção.
— Já de partida, Zé Carlos?
— Preciso pegar meu rumo,
Joana.
— Que pena. Volta quando?
— Não sei. Dependo dos fretes.
— Então, siga seus
planos.
Joana me deu um forte abraço e
um beijo na bochecha. Não sei se ela fez de propósito, mas conseguiu com que eu
sentisse vontade de ficar mais um pouco em Teresina.
— E quais são os seus planos
pra hoje, Joana?
— Hoje é dia de me apaixonar
por você.
Diante de tal convite, não tive
escolha nem desejo de pegar a estrada naquele dia. Fui para a casa de Joana,
onde nos amamos por quase uma semana, até que, sem mais poder viver longe dela,
decidimos juntar os trapos. E aqui estou, na nossa casinha na minha cidade
natal, esperando a minha amada acordar. A mesa já está posta. Hoje teremos
sanduíche de queijo e suco de acerola.
- Nota de esclarecimento: O conto "Pelas estradas do Nordeste" foi publicado por Notibras no dia 17/5/2024.
- https://www.notibras.com/site/vida-de-caminhoneiro-se-completa-juntando-trapos/
Nenhum comentário:
Postar um comentário