Laurentina Gomes. Gomes por conta do padre que a acolheu na
porta da igreja. Mamãe, recém-nascida, foi deixada embrulhada em trapos. O
religioso até pensou em cuidar da criança, mas a idade avançada o impediu.
Tanto é que, meses após ter acolhido mamãe, o homem não mais se levantou.
Tiveram que chamar outro padre às pressas para rezar missa.
Minha mãe acabou no orfanato e, apesar de ainda ser bebê, não
teve a sorte de ser adotada. Não que fosse feia, era até bonita, como provam
alguns raros retratos. É que, como mamãe sempre fala, ela não nasceu com a cor
da moda. Preta retinta, foi jogada para o final da fila até que completou 18
anos e foi atirada no mundo.
Trabalhou em casa de família, comeu o pão que
o diabo amassou. Não sofreu chibatadas, é verdade, mas os olhares, muitas vezes
silenciosos, a cortaram nas carnes. Precisava sobreviver e ficou calada, até
que a sorte lhe sorriu diante de uma banca de bicho.
Apostou no cachorro, deu veado na cabeça. Tudo
parecia perdido, não estava. Mamãe fez amizade com o apontador, o Binha, que
gostava de se fantasiar de mulher no carnaval. Ele arranjou emprego para mamãe,
que, desde então, cresceu na contravenção. A única mulher gerente na
região.
Levou tempo, mas todo mundo passou a conhecer
a Dona Laura. Após quase 40 anos no ofício, muita gente graúda foi no seu
velório. Rafael, meu marido, era um dos mais comovidos. Chorava como um bebê
diante do caixão.
— Dona Laura, a senhora sempre foi como uma
mãe pra mim.
Se mamãe pudesse ouvi-lo, certamente diria:
— Quem tem filho grande é elefante. Grupo 12!
- Nota de esclarecimento: O conto "Mamãe era assim" foi publicado por Notibras no dia 24/5/2024.
- https://www.notibras.com/site/quem-tem-filho-grande-e-elefante-grupo-12/
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