terça-feira, 12 de agosto de 2025

A costumeira urbanidade de tio Jorge

    

          Festa de família é algo que invariavelmente me estressa. Não que eu seja totalmente avessa a tais eventos, mas, caso possa evitá-los, não faço a menor cerimônia, ainda mais quando acontecem na casa de algum dos meus parentes.

          — José, você não queria passar o domingo com os seus pais? Sua mãe me disse que iria fazer aquela macarronada que a gente adora.

          — Margô, minha flor, mas eu prometi pra sua tia que iríamos.

          A tia em questão é a Solange, irmã favorita de papai. Eu até gosto dela. O problema é o marido, tio Jorge. Sabe aquele ser inconveniente até em missa de sétimo dia? Pois é assim que ele é. 

          E lá estávamos todos tristonhos assistindo ao padre Carlos, quando tio Jorge soltou essa:

          — Estranho, né, Margô?

          — O que é estranho, tio?

          — Essa descompostura.

          — Do que o senhor tá falando?

          — Ele nem veio?

          — Ele quem, tio?

          — O Mauro.

          E caiu na gargalhada. Para você que não está entendendo, Mauro era outro tio, que havia partido desta para melhor há exatos sete dias. Vendo por esse ângulo, imagino que o finado esteja mesmo em um ambiente mais agradável. 

          Mas a última mesmo do tio Jorge aconteceu ontem, quando meu marido insistiu para que fôssemos almoçar na casa da tia Solange. Uma santa, por sinal, pois para aturar o esposo... Ah, haja estômago!

          Logo após o almoço, estávamos sentados na ampla varanda, quando tio Jorge, com sua costumeira urbanidade, começou a puxar conversa comigo. Educada que sou, não quis causar imbróglios desnecessários.

          — E aí, Margô, quais as novidades?

          — Ih, tio, não tem novidade, não.

          — E o seu marido ainda tá pisando duro?

          Olhei para meu tio com ódio e respondi:

          — O senhor tá variando ou tá caducando?

          Em seguida, me levantei, dei dois beijos no rosto de tia Solange, olhei para meu marido e fui firme:

          — José, já tá na hora de irmos embora.

          E fomos!

  • Nota de esclarecimento: O conto "A costumeira urbanidade de tio Jorge" foi publicada por Notibras no dia 12/8/2025.
  • https://www.notibras.com/site/a-costumeira-urbanidade-de-tio-jorge/

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