Intuição. É o que me
disseram. Siga sempre a sua intuição, que não tem como dar errado. Hum! Cá
estou por causa dessa tal intuição, essa grande farsante que tem o poder da
ilusão.
Chame-a do que quiser, intuição, instinto,
sexto sentido, percepção extra-sensorial, não importa. O resultado sempre será
o mesmo. Sorte, então, não passa de mero acaso, e as probabilidades estão em
jogo, seja para fazer sorrir ou, no meu caso, se afogar em um mar de
lamentações.
Era jovem, ainda não contava com
16 anos, quando, por uma visão, imaginei-me rodeado de riquezas improváveis.
Inocente, puro e besta, lá fui eu me embrenhar naquele mundo onde os fracos e
desprovidos não têm vez. Tolice, hoje bem sei. Entre o ruim e o pior ainda,
arrisquei tudo o que não tinha em uma vida impossível para os de onde
vim.
— Tem certeza, meu jovem?
— E por acaso deveria ter alguma
dúvida, seu Carlos?
— Hum... Qual é mesmo o seu nome?
— Olegário, seu Carlos.
— Filho da dona Selma, né?
— Sim, seu Carlos.
— E ela tá sabendo?
— Há coisas que a mãe da gente
não precisa saber. Não é mesmo, seu Carlos?
— Hum...
E foi assim que consegui entrar
para o mundo do crime. E, logo de cara, tive a primeira lição, que, afinal, não
era de todo surpresa para alguém de onde vim. Se tiver que confiar sua vida a
alguém, fique longe de policiais que se embrenharam na criminalidade. Esses não
perderam os escrúpulos simplesmente porque nunca os tiveram.
Seu Carlos, que ocupava o topo da
cadeia alimentar na Ceilândia, foi traído por seu cúmplice em parte dos
negócios, justamente um policial militar que lhe dava guarida. Acabou preso em
uma operação deflagrada pela polícia civil, mas não pense que o alcaguete passou
incólume.
Pouco antes de
ser trancafiado, seu Carlos concatenou as ideias e concluiu que havia caído em
arapuca armada pelo tal cana. Não teve dúvida e ordenou que o traíra fosse
fisgado e, antes de ser despachado para o inferno, tivesse momentos
inesquecíveis nas mãos firmes de alguns dos mais experientes no quesito trato
com os desafetos.
Lição
aprendida, procurei me afastar de todo fardado que cruzasse a linha da
legalidade. O problema é que eu já era conhecido e, por isso, por mais que
tentasse me esconder, os tiras sabiam onde me encontrar. Carta já fora do
baralho, não tive escolha a não ser dar um jeito de não ser mais um dos
inúmeros "mortos em combate", mesmo não empunhando nem mesmo um
mísero canivete de escoteiro.
E cá estou, em frente à redação do Notibras, para me
entregar às autoridades. Não sei qual será o meu destino, mas, ao menos aqui,
diante das câmeras, tenho certa proteção. Todavia, já deixei de lado qualquer
esperança de sair dessa para situação melhor. Se bem que, agora mesmo, a minha
intuição cisma em me apontar um futuro promissor.
- Nota de esclarecimento: O conto "Uma farsante chamada intuição" foi publicada por Notibras no dia 29/6/2025.
- https://www.notibras.com/site/criminoso-arrependido-se-entrega-diante-de-cameras-e-garante-a-propria-vida/
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