sábado, 28 de junho de 2025

Dona Benedita, a camionete e o mecânico

    

 Dona Benedita, do alto dos seus 78 anos, mantinha-se firme ao volante da sua camionete Chevrolet C10 amarela. Quem visse aquela dupla não saberia afirmar com certeza qual das duas havia sido a maior vítima pelo passar dos anos. Seja como for, a velha não fora à oficina do Leopoldo, a Magnu, para fazer plástica, mas dar um jeito na lataria do veículo, que estava parecendo queijo suíço, de tantos furos. 

          Assim que chegou, a coroa foi ter um dedo de prosa com o Leopoldo, famoso por atrasos na entrega dos serviços. Mesmo sabendo desse revés, dona Benedita preferiu a demora aos imbróglios que, segundo ela, havia passado em outras mecânicas.

          — Seu Leopoldo, soube que o senhor é respeitador e, só por isso, entrego a Carlota em suas mãos.

          — Carlota?

          — Sim, a Carlota, a minha camionete.

          — Ah, tá, dona Benedita. Obrigado pela confiança.

          — O senhor não imagina o que passei nas outras oficinas.

          Sem histórico de curioso, Leopoldo nem quis saber sobre as tais coisas acontecidas com a cliente. Entretanto, dona Benedita não se fez de rogada e, não tardou, desembuchou o que estava travado na garganta.

          — Tô cansada de ser assediada por mecânicos.

          — O quê?

          — Pois é, seu Leopoldo, não sei o que esses mecânicos têm comigo. O senhor acredita que todos me chamam pra sair? Logo eu, uma viúva casta. 

          O dono da Magnu, pego de surpresa diante de tal revelação, não sabia se sorria ou se chorava. Em vez disso, arregalou os olhos e mostrou indignação.

          — Que desaforados, dona Benedita!

          — Pois é o que sempre digo, seu Leopoldo.

          — Mas pode ficar tranquila, que aqui é todo mundo respeitador.

          Após acertarem o serviço, dona Benedita e Leopoldo apertaram as mãos. Enquanto ela encarava o mecânico e esboçava aquele sorriso matreiro, ele olhava para todos os lados, como se fosse uma capivara poucos minutos antes de virar almoço da onça-pintada à espreita. E, assim que a mulher virou as costas, o sujeito coçou o queixo e pensou: "É, esse serviço tem que sair rapidinho!"

  • Nota de esclarecimento: O conto "Dona Benedita, a camionete e o mecânico" foi publicado por Notibras no dia 28/6/2025.
  • https://www.notibras.com/site/dona-benedita-a-velha-e-possante-camionete-amarela-carlota-e-o-mecanico/

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