Há tempos formado em
direito, tentou trabalhar na área por quase dois anos. Não durou muito nesse
ofício, pois não suportava a ideia de ter que entrar com ação contra os
clientes maus pagadores. Graças a alguns contatos, arranjou emprego numa
repartição. Mas sonhava em ser professor de história.
Apaixonado pela figura de
Napoleão Bonaparte, adorava se postar diante do amplo espelho do quarto. Ereto
e com a mão direita sobre o ventre, simulava dar vitoriosas aulas para uma sala
cheia de alunos, todos entusiasmados pela maneira do professor contar as
aventuras da maior figura da história da humanidade.
Os
sonhos de ser interlocutor de Napoleão, todavia, eram constantemente
interrompidos pelo avançar das horas. O homem tratava logo de correr para não
perder a hora no emprego. De pé no ônibus lotado, murmurava baixinho alguma
passagem do incomparável líder francês, mas ninguém parecia perceber. Problema
deles! Que permanecessem na ignorância!
Foi em
agosto, mês mais triste do ano, que aquela tragédia aconteceu. E para ser
emblemática, o homem calculou que o dia 16, que dividia o mês em duas partes
iguais, obviamente seria o mais repleto de lamúrias. Subiu em uma cadeira
diante do espelho e pulou. A corda, devidamente presa no lustre acima,
completou o trabalho. Enquanto o corpo balançava, um bilhete caiu-lhe da mão:
"Nem de longe sou Drummond, mas, de vez em quando, torço para que surja
uma pedra no caminho. Ao menos, seria uma pedra nessa estrada tão
vazia."
- Nota de esclarecimento: O conto "Entre Napoleão e Drummond" foi publicado por Notibras no dia 4/6/2024.
- https://www.notibras.com/site/servidor-sonhador-acaba-com-corda-no-pescoco/
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