Pascácios, no entanto, não faltam nesse mundo. Acreditam em
qualquer bobagem e, pior, querem porque querem reproduzir tolices, como se
fossem mimeógrafos entorpecidos pelo álcool. Carbonos borrados de brutamontes
que afinam diante da primeira intempérie, não suportam o confronto, tanto mais
a dor do parto. Covardes que são, deixemos esses tolos com suas tolices.
Hoje quero falar especificamente de um homem simples, mas
jamais simplório, que conheci quando lá estava eu com não mais de 25 anos,
talvez pouca coisa aqui ou acolá. Tanto faz, pois em nada muda o rumo da
história. Almir Matoso, vulgo Borracha, por conta da profissão, borracheiro
próximo às entranhas de Brasília.
Proveniente de Caicó, Rio Grande do Norte, Borracha chegou por
aqui pouco antes da inauguração da nova capital. Cheguei pouco tempo após e,
por conta de não um, mas dois pneus furados, fui socorrido pelo sujeito.
— Doutor, aqui tudo é estrada de chão, mas logo, logo vai ter
asfalto por todo canto. Por um lado, vai ser bom, mas, por outro, vai ser um
Deus nos acuda.
— Vai ter menos pneu para concertar?
— Vai ter até mais. Com o asfalto, vai encher de carro por
aqui. O problema é outro.
— Qual, meu amigo?
— O calorão vai ser de lascar.
Borracha, profético, sabia das coisas. Não possuía muito
estudo, nem chegou a cursar o científico, como se falava naqueles tempos.
Regulava com minha idade, mas sempre me tratou como doutor, talvez por conta do
paletó.
Na semana passada, quando minha filha veio me buscar para
almoço de domingo, passamos pela antiga borracharia do meu amigo. Nenhuma
placa, mas logo reconheci o local, apesar das inúmeras construções ao redor. O
asfalto, como Almir havia profetizado, havia tomado as ruas de barro
vermelho.
Pedi para minha filha parar por um instante. Desci e fui buscar
informações com algumas pessoas. A única que soube me dizer algo foi uma
senhora, que disse morar por ali há mais de 20 anos.
— O Borracha se aposentou e voltou para a terra natal. Mas já
deve ter morrido, pois era muito velho.
Agradeci pela informação e voltei a entrar no veículo da minha
filha. Seguimos para sua casa. O almoço estava delicioso, carne de sol com
aipim frito, que, certamente, o Borracha chamaria de macaxeira. Estou pensando
em lhe fazer uma visita, seja em Caicó, seja até no cemitério, pois também já
sou muito velho.
- Nota de esclarecimento: O conto "Almir, o borracheiro" foi publicado por Notibrs no dia 7/4/2024.
- https://www.notibras.com/site/potiguar-volta-para-caico-e-deixa-amigo-matutando/
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