domingo, 7 de abril de 2024

Em busca do Meia Morte

    

    Mal cheguei àquele bairro afastado de Aracaju, procurei informações a respeito do sujeito. Abordei um velho, que me disse que morava por ali desde antes da volta da democracia. Ele coçou o queixo proeminente, enquanto pensou por um instante.

          — Antônio Carlos Gomes Freire? Não conheço, não, senhor. 

          — Tem certeza?

          — Tenho, sim, senhor.

          Saquei uma fotografia do bolso e entreguei para o homem, que sorriu aquele sorriso desprovido de um dos dentes da frente.

          — Ah, bom! O senhor tá procurando o Meia Morte.

          — Meia Morte?

          — É como o chamamos por aqui. Mas por que é mesmo que o senhor tá procurando o Meia Morte? Ele está devendo algum dinheiro pro senhor?

          — Não, não. É que uma parenta dele quer saber por onde ele anda.

          — Parenta? Que parenta?

          — Uma sobrinha.

          — Se é sobrinha, deve ser filha de irmã ou irmão do Meia Morte. 

          — Irmã.

          — Nem sabia que o Meia Morte tinha irmã. Pois veja como são as coisas, fui saber disso pelo senhor.

          — Pois é. Sabe onde posso encontrá-lo?

          — Sei, sim, senhor. 

          — Onde?

          — Dobre aquela esquina. O senhor vai ver um barraco. Não tem erro. Tem um cachorro que não sai da porta. Tinhoso, mas não precisa assustar. O danado só late, se bem que me quase me mordeu o calcanhar na semana passada. 

          — É vacinado?

          — Sou, sim.

          — Digo o cachorro.

          — Num sei. Mas não precisa se preocupar. Aquele bicho não morde gente da polícia.

          — Não sou policial.

          — Mas parece. O cachorro não vai perceber.

          Agradeci pela informação e fui até o barraco do Meia Morte. Lá estava o cachorro em frente à porta. Ele me olhou com aqueles olhos esbugalhados, mas se afastou sem me mostrar os dentes. O velho tinha razão, devo ter mesmo pinta de policial.

          Não tardou, Meia Morte apareceu. Apesar de ser quase hora do almoço, o homem parecia ter acabado de acordar. Ele me perguntou o que eu queria. Entreguei-lhe a carta da sobrinha, onde ela dizia que a mãe havia falecido. Meia Morte, após ler a missiva, entrou e fechou a porta.

Ainda fiquei por ali durante um tempo, até que o cachorro voltou a se postar diante da porta. Fui embora antes que o bicho descobrisse que sou detetive particular e não tira.

  • Nota de esclarecimento: O conto "Em busca do Meia Morte" foi publicado por Notibrs no dia 7/4/2024.
  • https://www.notibras.com/site/detetive-esbarra-em-cao-na-busca-por-meia-morte/

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