A
despeito de tanta penúria, era final de Copa do Mundo e, apesar do Brasil já
ter sido eliminado há tempos, a paixão por futebol fez com que organizassem um
churrasco entre os residentes. Juvêncio ficou responsável pela cobrança da
quantia que todos que quisessem participar teriam que arcar. Nada que fizesse
tanta diferença aos paupérrimos bolsos, mesmo porque a maioria já estava
atolada em dívida no cartão de crédito.
E lá
foi o Juvêncio bater à porta dos vizinhos. Subiu as escadas até o terceiro
andar e, após breve conversa com todos daquele piso, desceu para o segundo, até
chegar ao último apartamento do primeiro andar, justamente o do novo morador. O
bate-papo rendeu não mais de cinco minutos, o suficiente para causar certa
confusão.
—
Vinte reais, né?
— Sim.
—
Minuto, que vou pegar.
— Ok.
— Aqui
está.
—
Valeu, Humberto!
— Ah,
não sei se vou poder ir.
— Mas
não tem devolução do dinheiro.
— Sem
problema, Juvêncio.
— Mas
aconteceu alguma coisa? Talvez, eu possa ajudá-lo.
— Não
se preocupe. É que o Juca, meu companheiro há quase 10 anos, não está muito
bem.
Os
dois se despediram e, em seguida, Juvêncio foi ao mercado para comprar as
bebidas e a carne, pois o churrasco seria na manhã seguinte, um domingo.
Entretanto, antes mesmo da noite dar sua graça, a fofoca já havia corrido por
todo o prédio. Pois é, o novo morador vivia com seu companheiro.
Enquanto os antigos residentes discutiam aquela situação, que nem era nova no
edifício, haja vista dois ou três casais do mesmo sexo viveram ali, além de
outros tantos solteiros, sem contar os que mantinham bem trancadas as portas do
armário. Porém, a curiosidade aguçou a mente de muitos, que conjecturavam a
aparência do tal companheiro do novo vizinho.
Já na
manhã seguinte, quando o samba tomava conta do ambiente enquanto a partida não
iniciava, as primeiras latas de cerveja eram abertas. As apostas eram firmadas,
mas nada de dinheiro, que, de tão curto, não valia o risco de ser desperdiçado
por um palpite infeliz. Nisso, eis que surgiu o Humberto, com cara de quem
havia passado a noite em claro. Logo se formou um círculo à sua volta.
— Bom
dia, Humberto! Como está o seu companheiro?
— Ah,
bem melhor!
— Que
bom!
— E o
que ele tinha?
— A
culpa foi minha. Só dei um pedacinho de pizza, e ele teve aquela diarreia. Mas
o veterinário já me passou a medicação, e o Juca está novinho em folha. Não sei
como é que não tá latindo.
- Nota de esclarecimento: O conto "Humberto e seu companheiro" foi publicado por Notibras no dia 11/7/2024.
- https://www.notibras.com/site/juca-vai-a-veterinario-depois-de-pizza-e-humberto-ao-churrasco/
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