Bons tempos, eu posso afirmar, quando era possível tatear e
passar as páginas de um livro, alguma revista ou o jornal que papai me pedia
para comprar todos os dias na banca do Vicente, que ficava logo ali na esquina.
Não que hoje ainda não possamos sentir o inebriante cheiro do papel, mas creio
que, talvez em alguma geração não muito distante, isso será apenas peça de
museu.
Saudosismo que aflora, quero contar algo que me aconteceu nos
meus então oito ou nove anos. Era domingo, pois a garotada estava toda reunida
na rua. Papai, como de costume, me deu dinheiro para comprar o jornal. E lá fui
eu quase correndo, pois queria ir logo brincar com meus amigos.
O Vicente, mal me olhou, pegou o jornal do meu pai e me
entregou. No entanto, percebi algo que me encantou. Era uma revista do tamanho
de revista de adulto, bem maior do que os gibis. Meus olhos devem ter brilhado,
pois o dono da banca apontou para um exemplar.
— Joaquina, chegou a revista em quadrinhos do Mogli, o Menino
Lobo.
Nem lembro se falei alguma coisa, saí correndo para casa, onde
encontrei papai sentado na poltrona da sala. Ele me perguntou se eu havia me
deparado com o Bicho-Papão. Só sei que, esbaforida, me postei diante do meu
pai.
— Mogli.
— Quem?
— Mogli, o Menino Lobo!
Contei sobre a tal revista, e meu pai me pegou no colo e me deu
um beijo na bochecha.
— Vamos lá no Vicente, que também quero ler essa revista desse
guri que vive com os lobos.
Daquele dia até completar uns 12 anos, viajei muito pelas
páginas maravilhosamente desenhadas. Cada detalhe me encantava e, não raro,
percebia algo que havia passado em branco. De tão manuseada, as folhas foram
ficando mais finas, um rasgo aqui, outro ali, mas nada que uma boa fita durex
não resolvesse. Isso até que a guardei no fundo do armário e nunca mais a
folheei.
Pouco tempo depois de terminar a faculdade, procurei minha tão
amada revista. Não sei se aconteceu em uma das mudanças ou se foi por conta de
alguma faxina. Ela sumiu. Nunca mais a encontrei.
O
tempo, desde então, parece ter voado. Comecei a trabalhar, conheci meu futuro
marido, com quem me casei alguns anos após. Vieram os filhos e, há alguns anos,
nasceu a Evelina, minha neta. Não sei o que me deu hoje, mas bateu uma saudade
tão grande da minha revista do Mogli.
Nota de esclarecimento: O conto "A revista do Mogli, o Menino Lobo" foi publicado por Notibras no dia 12/7/2024.
https://www.notibras.com/site/ninguem-esquece-do-mogli-e-bate-uma-saudade/
Nenhum comentário:
Postar um comentário