Quando Maicon entrou
naquele ambiente, era como se já o aguardassem. Ele não se sentiu deslocado,
pois percebeu que ali se encontrava gente parecida, mesmo que nunca tivessem se
esbarrado. Não sentiu medo, era seu destino, a sina dos seus semelhantes que
moravam no bairro.
Enquanto caminhava pelo pátio, foi
cumprimentado por alguns, enquanto olhares curiosos avaliavam o novo detento. A
despeito daquela turba não ser diferente da que estava acostumado, o rapaz
sabia que precisava se enturmar. O propósito ia muito além de amizade ou
camaradagem. Era questão de sobrevivência.
Apesar de já
conhecer algumas gírias daquele ambiente antes de ser preso, Maicon percebeu
que não sabia a maioria. Cama era jega. Portanto, se tá de jega, tá dormindo. E
nada de dar uma de cabrito, pois dedo-duro não dura muito na cadeia.
Maicon, de tanta
xepa estragada, precisou se agachar no boi até o estômago se acostumar. Levou
tempo, mas tempo é o que possuía de sobra. Dos 28 anos, teria que cumprir pelo
menos 11 no arame até conseguir progressão da pena. Fugir, então, era uma
possibilidade. Só estava esperando cavarem um túnel. O problema é que a cadeia andava
virada demais por aqueles dias, o que provocava a revista minuciosa nos
barracos.
Aliás, quem mais temia virar a cadeia era
a turma dos duzentões. Bandido não perdoa alma sebosa. Se fosse jack, estava no
sal. Aprontou lá fora com a mulherada, seria usado, abusado e morto pelos
outros detentos.
Do arroz e do pão podre, fazia-se
a choca. O cheiro era ruim, o gosto ainda pior. Mas para quem não tem nada
melhor, era essa cachaça que fazia a cabeça da galera. Aliás, pão é nome lá
fora, pois ali é chamado de marroco. Leite que nada, é chernobyl.
Maicon sabia
respeitar enquanto os presos se divertiam com as respectivas patroas no
parlatório. Se não tivesse esposa, namorada ou ficante, que pagasse por uma,
alcunhada de parlaboi. Que fosse assim ou a covardia.
Fugiu no cavalo
doido, quando os mais corajosos fizeram uma pirâmide rente ao muro. Coragem de
fugir não lhe faltava. Tratou de juntar os trapos e fazer uma tereza que
aguentasse seu peso durante a fuga. Cinco metros é muita coisa para pular, a
tereza de três já lhe salvaria a pele de se esborrachar no asfalto do outro
lado.
Ao soltar a tereza, não se machucou. Caiu que nem gato e se desembestou. Entretanto, tomou dois tecos nas costas e um na cabeça. Nem teve tempo de saber que estava morto. Fora traído por um dos companheiros de cela, justamente o Salomão. Cabrito dos infernos!
- Nota de esclarecimento: O conto "Maicon, o condenado" foi publicado por Notibras no dia 13/7/2024.
- https://www.notibras.com/site/maicon-o-condenado-perde-liberdade-com-tres-tiros/
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