quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Zero-Zero, o Don Juan de Sobradinho

          

        E não é que abriu uma igreja bem ao lado da Magnu, a mais concorrida oficina de Sobradinho?! Pois é, o Leopoldo tratou logo de orientar os seus funcionários a não utilizarem palavras de baixo calão quando os frequentadores, boa parte deles composta por senhoras da alta sociedade da região, estivessem por perto. E, quando isso fosse inevitável, que falassem baixinho. 

          Cabo Matias, também conhecido pela alcunha de Zero-Zero, tem se empenhado em demasia para manter a língua longe de palavrões. Não que tenha virado coroinha, mas parece que vislumbrou a possibilidade de ser, digamos, consorte de uma das velhinhas endinheiradas. Tanto é que encomendou um perfume francês comprado diretamente das mãos da Margô, cuja fama de vigarista ainda não chegou aos ouvidos ingênuos do aprendiz de Don Juan. 

          — É francês mesmo, né, Margô?

          — Pois tenho cara de trambiqueira? 

          Munido do líquido milagroso depositado no frasco quase original, lá foi o Zero-Zero caprichar no banho, pois aquele domingo de culto prometia. O gajo já estava de olho na Ludmila, viúva que, apesar de não ostentar tanto, gozava de robusta aposentadoria de ex-funcionária do Banco Central do Brasil. Lançou a isca e, já na primeira troca de olhares, a velha foi fisgada por aquele rapazola bigodudo. 

          O namorico virou coisa séria, ainda mais porque o improvável aconteceu. Pois é, em vez de virar gigolô, o Zero-Zero se viu apaixonado pela religiosa. E, para piorar a situação do sujeito, começou a ter crises de ciúme. Todavia, não que a coroa lhe adornasse a cabeça com dois pares de chifres. Nananinanão! O caso era mais sério e, não tardou, o mecânico foi desabafar com o patrão.

          — Leopoldo, a Ludmila é um amor, mas tem um probleminha.

          —Zero-Zero, uma senhora daquela idade deve ter um monte de problemas: hipertensão, articulações, glicose nas alturas...

          — Que nada! Os exames dela são melhores do que os meus.

          — Sério?

          — Sério!

          — Então, qual é o problema da sua amada?

          — Bingo.

          — Bingo?

          — Sim! Bingo.

          — E isso lá é problema, Zero-Zero?

          — Não seria, a menos que ela não torrasse quase toda a aposentadoria em apostas.

          — Sério?

          — Sério!

          — Eita!

          — E tem mais, Leopoldo!

          — Mais?

          — Sim.

          — Pois diga!

          — Já emprestei o que tinha e o que não tinha.

          — Eita!

          — Pra você ver.

          — Eita!

          — E tem mais!

          — Mais?

          — Sim!

          — Sério?

          — Sério!

          — Pois diga lá!

          — Você pode me adiantar o salário? É que hoje é dia de bingo, e a Ludmila tem certeza de que é o seu dia de sorte.

  • Nota de esclarecimento: O conto "Zero-Zero, o Don Juan de Sobradinho" foi publicado por Notibras no dia 4/9/2025.
  • https://www.notibras.com/site/zero-zero-o-don-juan-de-sobradinho/

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