Gente, por que estou
falando do meu tio? A ideia inicial não era essa. É que quero contar uma coisa
que aconteceu há poucos dias, e que levei três dias para me livrar do fedor.
Sabe caixa de
gordura? Pois é, de vez em quando, meu pai limpa a daqui de casa. Que nojo!
Então, sempre que percebo que ele está separando os apetrechos para limpá-la,
trato de me esconder. Mas eis que, na semana passada, o meu velho me pegou
distraído.
— Gabriel, vem cá me dar uma mão.
— Ah, pai, tô ocupado.
— Ocupado? Tu tá aí de bobeira no sofá, que eu sei.
Sem ter desculpas para inventar, tive que encarar a tarefa
de ajudar papai. Mas que ele não viesse com a ideia de querer me fazer meter a
mão naquela gordura com cheiro repugnante. Eca!
— O que foi, pai?
— Traga a mangueira até aqui.
Fiz o que meu pai mandou e quis entregá-la. Meu velho me
olhou com uma cara de nenhum amigo.
— Gabriel, não tá vendo que tô com as mãos
ocupadas?
— Hum...
— Hum o quê?
— Nada.
— Ligue a mangueira e jogue água dentro da caixa
de gordura.
Meu pai, que já havia transferido quase toda aquela
gosma da caixa de gordura para um balde ao lado, ficou observando a minha
lerdeza. Finalmente, liguei a torneira. Não tardou, a água começou a sair forte
que nem ducha.
— Gabriel, aponte a mangueira pra caixa de gordura!
— Tô tentando, pai!
— Gabriel, você tá me molhando todo!
Era verdade. Meu pai parecia ter saído de um temporal, pois
eu, com o estômago embrulhado por conta daquele cheiro horrível vindo
principalmente do balde ao lado, não conseguia direcionar a mangueira de modo certeiro.
— Num vai vomitar em mim, não!
Nunca papai foi tão profético. O vômito saiu como cachoeira
sobre os negros cabelos do meu pai. Era possível ver nitidamente dois ou três
grãos de milho no cocuruto do meu coroa. Furioso que ficou, papai perdeu
qualquer noção de racionalidade. Sabe o que ele fez? Pois acredite, ele fez
mesmo! Despejou todo o conteúdo do balde sobre os meus lindos cabelos. Pode uma
coisa dessa?
Mamãe, quando viu, quis brigar com meu pai. No
entanto, não sei o que deu nela, pois desandou a gargalhar diante do estado de
calamidade que ficou minhas lindas madeixas. Pior foi a minha irmã quando
soube. Não perdeu a oportunidade de me apelidar de Gabriel Gordurinha. Ainda
bem que o apelido não pegou, se bem que, vez ou outra, meu tio, aquele mesmo
que só fala “douze” e “mermo”, me chama assim.
Tive que gastar dois frascos inteiros de xampu
e quatro sabonetes para me limpar. Pode parecer engraçado para você, mas juro
que, ainda hoje, cada vez mais próximo ao meu aniversário, ainda sinto aquele
fedor. Não tenho mágoa do papai por conta do que fez, mas creio que ele pegou
pesado demais comigo naquele dia.
- Nota de esclarecimento: O conto "Papai e a caixa de gordura" foi publicado por Notibras no dia 18/2/2025.
- https://www.notibras.com/site/limpeza-da-caixa-de-gordura-vira-gota-dagua-em-ceilandia/
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