— Não creio que seja, mamãe. Papai, apesar
de nunca ter sido santo, não teria cacife para bancar essa gata.
— Carlos Augusto, por favor!
Respeite a memória do seu pai.
— Tá bom, mãe! Não tá mais aqui
quem falou.
— Pois desconfio de outra coisa.
— Do quê, Márcia?
— Pode ser que ela seja nossa
irmã.
— Branca daquele jeito? Nem se
papai tivesse feito aquele lance que o Michael Jackson fez.
— Por favor! Calem a boca! Não
podem fazer um minuto de silêncio?
A despeito dos protestos de
Laura, ela continuava com a pulga atrás da orelha. Afinal, quem era aquela
moça? Curiosa, aproximou-se.
— Bom dia.
— Bom dia.
— Laura.
— Sei quem é a senhora.
— E de onde me conhece? Posso
saber?
— Claro que pode, agora que o seu
Alberto se foi.
— Seu Alberto? Pelo visto, meu
filho estava errado em relação a você.
— Carlos Augusto?
— Sim. Você o conhece também?
— Não exatamente como a senhora
poderia supor.
— E como seria?
— Como eu o conheço?
— Sim.
— Da mesma forma que a conheço,
bem como também a Márcia, filha da senhora e do seu Alberto.
— Estou curiosa. Pode me
esclarecer isso tudo, por favor?
— Será um prazer.
Laura apontou um banco sob uma árvore. As duas foram até lá e se
sentaram.
— Dona Laura, seu marido matou
meu pai.
— O quê?
— Isso foi há quase 20 anos,
quando eu ainda era recém-nascida. Papai não era flor que se cheire, metido com
a bandidagem. Os caminhos do meu pai e do seu marido se cruzaram de maneira
trágica. Seu Augusto, como a senhora sabe, era policial. Em uma troca de tiros,
seu marido foi ferido por meu pai, que também foi atingido.
— Eu me lembro desse dia. Alberto
quase morreu. Tomou um tiro na coxa, perdeu muito sangue.
— Sim. Meu
pai foi atingido no coração e morreu no local.
— Tá, mas e daí?
— E daí o quê?
— Como você veio parar aqui? Como você me
conhece? Como você sabe quem são meus filhos? Afinal, como você mesma disse,
você não passava de um bebê.
— Seu Augusto, após se recuperar, foi atrás da
minha mãe. Ele estava cheio de culpa por ter tirado a vida do marido dela. Ele
passou a ajudar financeiramente minha mãe até que fiquei adulta. Seu Alberto
foi um homem muito bom.
— Ele nunca me contou sobre isso.
— Sei disso, pois ele fez mamãe prometer que essa história jamais
chegasse aos ouvidos da senhora e dos seus filhos.
— E por que você está me contando isso tudo
agora? Por quê?
— Seu Alberto me procurou há cinco meses. Disse
que estava com câncer, que os médicos o haviam desenganado. Ele me pediu para
contar tudo para a senhora, pois não queria que a sua família viesse a saber
pela boca de outra pessoa.
Laura fitou a jovem por alguns instantes até que
a emoção a empurrou para um abraço. A viúva chorou e, depois de recomposta, viu
a moça partir. Elas nunca mais se viram.
Após o enterro,
Laura e os filhos retornaram para casa. A mulher contou a história da jovem. Os
filhos, misto de perplexidade e admiração, entenderam que o pai havia tomado a
decisão certa.
— Mamãe, e qual era o nome da moça?
— Márcia, minha filha, não tive tempo de
perguntar.
- Nota de esclarecimento: O conto "A jovem misteriosa" foi publicado por Notibras no dia 1º/2/2025.
- https://www.notibras.com/site/a-jovem-misteriosa-e-o-enterro-do-policial/
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