Tem o grande, que é o principal, onde repouso a cabeça. Outro,
um tanto menor, que alcunhei de intermediário, e que coloco entre os joelhos.
Tem ainda o menor que o intermediário, que não tem nome, mas que me é bastante
útil, pois é o primeiro que uso para me proteger de ataques de seres alados e
barulhentos. Por último, mas não menos importante, tem o menorzinho de todos e,
por isso mesmo, apelidado de caçula. Este gosto de colocar sobre os olhos,
pois, como se fosse cafuné de vovó, me acalma.
Certamente você já se deparou com algum
pernilongo metido a tocador de saxofone. O bicho, inconveniente que nem aquele
povo que insiste em tocar a campainha num dia de domingo às seis da matina,
resolveu se aventurar a fazer uma sinfonia justamente na minha orelha quando
meus lindos olhos castanhos já estava prestes a ser convencidos de que era
chegada a hora de adentrar no mundo de Morfeu.
Ágil que nem patada de gato, acerto o
miserável seresteiro com uma travesseirada, que, mesmo se fosse elefante, teria
caído durinho. Silêncio! Apuro os ouvidos e, quase convencida de que havia
conseguido dar cabo do cretino, volto a depositar minha face esquerda sobre o
travesseiro maior. Ledo engano. A serenata logo recomeçou, o que me deixou na
dúvida se seria o mesmo ou um parceiro desafinado.
Taquei o caçula, taquei os outros dois, recorri até ao
grandão, determinada a pôr fim naquele martírio. No entanto, por mais saraivadas
eu desferia, o barulho aumentava cada vez mais. Acendi a luz do quarto, e a
coisa tinha tudo para descambar para uma terceira guerra mundial, quando o meu
marido, sonolento que nem bicho-preguiça, tocou meu braço.
— Maria Lúcia, você tá bem?
— Bem? Estou travando uma
batalha infernal com esse maldito mosquito.
— Mosquito? Que mosquito?
— Num tá ouvindo?
— Não.
— Num é possível! Além de velho, agora também tá surdo?
— Meu bem, isso é alguém buzinando lá fora.
O Zeca estava certo. Era mesmo um motorista inconveniente
buzinando. Depois de algum tempo, parou. Finalmente, poderia tentar dormir
sossegada, mas eis que me bateu aquele remorso. É que havia praguejado tanto contra
o pobre pernilongo, que, caso eu o tivesse acertado, não iria sobrar nem a
pobre alma do miúdo.
- Nota de esclarecimento: O conto "Guerra ao mosquito" foi publicado por Notibras no dia 16/2/2025.
- https://www.notibras.com/site/maria-lucia-trava-guerra-a-mosquito-quando-o-zumbido-era-da-buzina-de-um-carro/
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