—
Preste atenção em uma coisa, Amâncio.
—
Sim, vovô.
—
Nunca brigue. Nunca mesmo! Jamais!
—
Sim, vovô.
—
Mas vai chegar o dia... Bem, vai chegar o dia em que você não poderá evitar a
briga. Então, você terá que tomar uma atitude drástica.
O
menino, olhos arregalados, aguardou ansiosamente pelas sábias palavras do
velho.
— Pois bem, Amâncio, quando
esse dia chegar, é melhor você estar preparado.
— Vou ter que brigar, né, vovô?
—
Brigar? Pra ficar com um olho roxo ou um dente quebrado? Óbvio que não,
Amâncio! Você precisa estar preparado para correr. E trate de correr o mais
rápido que você puder!
Amâncio, agora homem formado, se lembrava das sábias palavras do seu
avô, enquanto caminhava destemidamente para entrar em conflito contra um tipo
que, diziam as línguas fofoqueiras, estaria se aproveitando da ausência do
grandalhão para esquentar os lençóis da Marluce.
Quem, afinal, era Marluce? Marluce Antunes da
Silva, mulher de 35 anos, cabelos negros, olhos castanhos, sorriso bonito,
corpo incapaz de não ser notado por onde passava, era, há quase cinco anos,
namorada do Amâncio. Quer dizer, a mulher era mais do que namorada, algo mais
do tipo namorida, haja vista o tempo de relacionamento, sem contar as promessas
de breve noivado e, talvez para dali a mais cinco anos, de casamento de papel
passado.
Determinado a tomar
uma atitude drástica, Amâncio, passos firmes, não deixaria tamanha traição de
lado. Ah, não mesmo! Já chegaria dando uma bicuda na porta, pegaria o gajo pelo
pescoço, enquanto a adúltera, olhos arregalados, aprenderia de vez por todas a
lição. Era a hora inadiável de mostrar quem é que mandava naquela parada.
Não chutou a porta. Não por falta de coragem, mas simplesmente
porque ela já se encontrava aberta. Tal detalhe, aliás, provocou ainda mais ira
no Amâncio, que viu nisso completa falta de pudor dos amantes, que não
demonstravam qualquer resquício de pudor para camuflar a traição.
Amâncio,
mal colocou os pés na residência, escutou risos vindos do quarto. Furioso, foi
até lá e flagrou Marluce e Augusto em trajes sumários. Augusto? O padeiro? Tem
certeza? Absoluta! No entanto, antes que Amâncio pudesse proferir qualquer
palavra, eis que a mulher, perspicaz como ela só, se virou para o namorado e
disse:
— Já
não era sem tempo, Amâncio! Por onde você andava?
Amâncio,
estático, não conseguiu respondê-la, até que Marluce continuou seu monólogo.
— Então,
vai ou não vai me pedir em casamento? Ou será que terei que te trair de verdade
para que você tome uma decisão quanto a isso?
Embasbacado,
Amâncio nem percebeu quando Augusto passou por ele com calça, camisa, sapatos e
meias nas mãos. Se aquilo era ou não um truque para fazer com que Amâncio
pedisse a mão da namorada em casamento, não se sabe. Seja como for, o casório
aconteceu no mês seguinte e, desde então, os dois pombinhos vivem muito bem.
Ah, quanto ao Augusto, foi um dos padrinhos de casamento e, dizem, será também
do primogênito do casal.
- Nota de esclarecimento: O conto "Amâncio não é de briga" foi publicado por Notibras no dia 3/2/2025.
- https://www.notibras.com/site/amancio-orientacao-do-vo-foge-de-brigas-e-cai-na-armadilha-do-casamento/
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