A contragosto, o pai da noiva a levou até o altar, onde a
entregou a Tobias. Dona Juliana, tentando controlar as emoções, verteu em
lágrimas todo seu desespero. Os presentes devem ter achado que a mulher estava
chorando de felicidade e, ao final da cerimônia, foram parabenizá-la por
momento tão único na vida de uma mãe, que é ver os filhos partirem para formar
a própria família.
Os primeiros meses do casório foram repletos de romantismo.
Tobias, aos 26 anos, procurava dar atenção à esposa, que ainda não havia
completado 22. Ela, por sua vez, precisava se desdobrar nos afazeres domésticos
logo após chegar exausta da faculdade, onde cursava pedagogia.
Não se sabe ao certo o motivo, mas parece
que as mudanças começaram logo após Claudionora se formar. Ela, a princípio,
não percebeu, mas dona Juliana não deixou de notar o olhar de ressentimento do
genro. O homem, que trabalhava numa repartição pública, mal havia completado os
estudos e jamais teve pretensão de fazer faculdade.
A situação degringolou de vez quando
Claudionora começou a dar aulas e, pior, a ganhar o próprio dinheiro. Foi aí
que a ficha caiu. A mulher até tentou se desvencilhar desse pensamento, mas não
era tola o suficiente para continuar acreditando em sonhos de fada. Seus pais
estavam certos: Tobias era mesmo um traste.
Claudionora pensou em se
separar, mas divórcio estava fora de cogitação. Religiosa que era, acreditava
nas palavras ditas pelo padre. Casamento era para toda vida, independentemente
dos percalços pelo caminho, que foram muitos, ainda mais quando Tobias perdeu
qualquer resquício de pudor em relação à própria misoginia.
O sujeito passou a tratar a esposa como se fosse sua
empregada. Bebia além da conta, empanturrava-se como se não houvesse amanhã. O
peso já ultrapassara os 130 quilos. Mal chegava do emprego, o cretino se sentava
na poltrona em frente à televisão e gritava.
— Mulher, cadê a minha cerveja?
Claudionora, nesses momentos, queria pular no
pescoço do marido e esganá-lo. Olhava para o teto da cozinha como se Céu fosse
e rezava. Em seguida, abria a geladeira e pegava uma das inúmeras latas de cerveja.
— Aqui está.
— Por que demorou tanto, mulher?
— Tô com o feijão no fogo.
— Hum.
A esposa, mal voltou para cozinha, ouviu o
berro do gajo.
— Claudionora, vem cá!
A esposa arfou, mas foi ver o que Tobias
queria.
— Diga.
— Andei pensando em uma coisa.
— Hum.
— Não tem o Tonho da padaria?
— Hum.
— Sabia que a mulher dele completou 60
anos?
— Hum.
— Pois é, 60 anos! Já imaginou o Tonho
tendo que viver ao lado de uma velha de 60 anos? Eu é que não conseguiria.
— Tobias, meu esposo, taí uma
coisa que você não precisa se preocupar.
— Não?
— Não.
— Ué, por quê?
— Amor da minha vida, quando eu chegar aos 60 anos, já serei viúva há um tempão.
- Nota de esclarecimento: O conto "Claudionora e o traste" foi publicado por Notibras no dia 6/1/2025.
- https://www.notibras.com/site/marido-fica-a-beira-da-cova-apos-esposa-ex-submissa-estudar-e-arranjar-emprego/
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