Altemar,
que não era Dutra, mas Silva, agora aos 65 anos, finalmente conseguiu algo que
buscou durante toda a longa jornada de trabalhador: a aposentadoria. Pensou até
em fazer aquela festança e chamar os companheiros, mas logo desistiu. Não iria
gastar um tostão com miudezas, ainda mais porque o dinheiro sempre lhe foi
curto.
Sem
filhos, Altemar há tempos também fora abandonado pela mulher. Melhor para ela,
que juntou os panos com um bem-sucedido empresário do ramo de importação.
Não tardou, teve dois filhos, que puderam estudar nas melhores escolas da
cidade.
Quanto ao
Altemar, nem teve tempo de sentir dor de cotovelo, pois os boletos não pararam
de ser depositados debaixo da sua porta. Isso, aliás, não o impedia de, vez ou
outra, buscar um cobertor de orelha na esquina. O problema é que, com o passar
dos anos, aquilo virou um hábito.
Os amigos, preocupados com os longos sumiços do Altemar,
certa feita, juntaram-se em cinco ou seis e lá foram para o apartamento do
gajo. Encontraram-no esparramado no sofá. Cara amarrotada, o aposentado abriu a
porta com aquele sorriso.
— Altemar, que tal pegarmos um clube amanhã?
— Não posso, Marcos.
— Como não?
— É que hoje tenho compromisso com a Marcinha.
— Que Marcinha?
— É uma senhorita que conheci na boate.
— Boate? Que boate?
— Da luz rubra, Roberto.
— Altemar, que vida é essa?
— Juca, é a vida que sempre sonhei pra mim: um cabaré ao
som do Cauby.
- Nota de esclarecimento: O conto "O som da aposentadoria" foi publicado por Notibras no dia 11/11/2024.
- https://www.notibras.com/site/altemar-enfim-curte-vida-que-sonhou-em-cabare/
Nenhum comentário:
Postar um comentário