quinta-feira, 2 de outubro de 2025

Um mundo infinito

          

        Não se sabe se enlouqueceu quando desejou desistir daquela vida e buscar obscuras trilhas ou, então, loucos eram os demais, que preferiam continuar na mesmice, talvez porque não percebessem que aquilo era engodo que nem minhoca na ponta do anzol.

          — Você está bem, Orlando?

          Nem mesmo um mísero "Hum?". O sujeito parecia alheio a tudo e a todos, como se sua mente estivesse absorta. Que lugar estranho era aquele, onde pensamentos são livres? Aquilo era aceitável?

          — Orlando. Orlando! Você está me ouvindo?

          — Ih, acho que ele pirou de vez. 

          — Sabe o que aconteceu com ele?

          — Acho que foi porque ficou trancado numa biblioteca no final de semana.

          — Sério? 

          — Seriíssimo!

          — Coitado. Será que viu fantasma?

          — Pior.

          — Pior?

          — Livros.

          — Livros?

          — Sim, livros.

          — Nossa! Coitado. 

          — Pois é. É de dar dor.

          — Será que tem cura?

          — Segundo ouvi, é caso perdido.

          — Ih, coitadinho!

          — E já prenderam o culpado?

          — Parece que foi caso pensado.

          — Pensado?

          — Sim, ele se escondeu atrás das estantes com aqueles livros todos.

          — E ninguém viu?

          — Só na segunda-feira, quando abriram a biblioteca. O pobre coitado estava fascinado por um volume de um tal... Como é mesmo o nome?

          — Sei lá! Tá me estranhando?

          — Claro que não! Sei bem que a sua índole é honesta. Mas era alguma ferramenta.

          — Ferramenta?

          — Sim, o nome do culpado.

          — Bom sujeito é que não pode ser, meu amigo.

          — É verdade! Ah, me lembrei!

          — Lembrou?

          — Sim! O tal autor do livro.

          — E quem é esse criminoso?

          — Machado.

          — Machado?

          — Machado!

          — Eita! Nunca ouvi falar.

          — Nem eu.

          — Tem certeza de que era mesmo esse o nome, meu amigo?

          — Sim. Achei engraçado.

          — Engraçado?

          — É que o sujeito também tinha um nome de mulher.

          — De mulher?

          — Sim. Maria.

          — Maria?

          — Ah, então, era uma mulher.

          — Não.

          — Não?

          — Não!

          — E como é que isso é possível?

          — É que o bandido se chamava Joaquim Maria Machado de Assis.

          — Com um nome desses, sujeito direito é que não pode ser.

          — Pois é. Pobre Orlando.

          — Pobrezinho.

        Sorriso desajustado no rosto, Orlando foi carregado por trogloditas, que, inutilmente, tentaram fazer com que ele largasse aquele livro. Nem capitulou. Bendito livro, por sinal!

  • Nota de esclarecimento: O conto "Um mundo infinito" foi publicado por Notibras no dia 2/10/2025.
  • https://www.notibras.com/site/orlando-nao-queria-mais-a-minhoca-na-ponta-do-anzol/

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