segunda-feira, 6 de outubro de 2025

As frases que roubo do Marcio Petracco

    
       Minha mulher, a afamada Dona Irene, costuma dizer que sou muito apegado às amizades que fiz e continuo fazendo ao longo da vida. E, entre tantos amigos que ganhei, certamente o Marcio Petracco, icônico guitarrista da banda gaúcha TNT, entre tantas outras, merece destaque. Não por ser um astro do bom e velho rock and roll, mas por conta do seu jeito despojado e carismático de bater papo com os mais variados cidadãos deste país. Seja com um grande executivo de uma gravadora, seja com uma pessoa em situação de rua, seja até mesmo com este escritor de ouvidos ávidos por qualquer frase para ser utilizada em um texto.

          Enquanto transito entre o Rio, Brasília e o bairro do Menino Deus, em Porto Alegre, fico atento a qualquer dica que, de repente, possa se tornar um conto ou uma crônica que me faça insuflar o peito e dizer: "Amorzinho, olha aqui o que acabei de gestar!" É verdade que nem tudo são flores, isto é, o parto nem sempre ocorre de maneira tranquila. Não raro, é preciso usar até fórceps para que a história nasça. Vida de escritor não é fácil. Ou você pensa que é só abarrotar uma folha com um monte de palavras?

          Um passeio com minhas buldogues, a Bebel e a Clarinha, ou, então, uma ida ao parquinho com a minha caçula, a Malulinha, me ajudam no processo de ruminação do texto. O que quero dizer é que preciso dar um tempo para, assim, possibilitar a história e, muitas vezes, a ideia inicial do desfecho nem existe ou, então, quando há uma, acontece de encontrar outra no meio do caminho, como se a vida fosse bolinha de gude descendo uma enorme escada tão íngreme, que nada está definido até o espirro final. 

          Voltando ao Petracco, a quem costumo chamar de Don Marcito, vez ou outra o encontro no cachorródromo do Tesourinha, onde o Cacau e o Coco, os cães do meu amigo, brincam com as minhas meninas de cara achatada. Enquanto a garotada focinhuda se diverte, me delicio com os inúmeros causos do Marcio. E, como não sou bobo, sempre estou com um bloquinho de notas e uma providencial caneta no bolso. 

          Já me perguntaram qual é o meu texto mais lido. Bem, realmente não sei. Entretanto, o mais premiado é O pai do rock foi um péssimo caçador, que até hoje me gera dúvida se é uma crônica ou um conto. Esse texto já foi agraciado como a melhor crônica pela UFSCar, ganhou uma medalha da CAPOLAT, além de compor o meu livro 57 Contos e crônicas por um autor muito velho, que venceu o Prêmio Literário Clarice Lispector/20205 na categoria contos. 

          Não sei se é pelo fato do Don Marcito e eu degustarmos o mesmo signo (Aquário), com um ano e um dia de diferença entre os nossos aniversários ou, talvez, seja algo que nem os astros expliquem. Todavia, sei que tem algo aí, já que o meu parceiro tem o dom de me iluminar as ideias quando sai uma frase mágica de seus lábios tão acostumados a cantar rock. O fato é que, invariavelmente, a trama se desenha quase que imediatamente na minha mente, como se cada palavra se ajustasse para que, assim que eu retorne ao lar, doce lar, me sente em frente ao computador e, em questão de minutos, a história está pronta. 

          Foi assim com O pai do rock foi um péssimo caçador e tantas outras. Mas eis que, quando eu mando para o Don Marcito o que acabei de escrever, ele ainda tem a cara de pau de me mandar essa:

          — Que história legal que a gente fez, Dudu!

          — Ei, peraí! Roubei apenas uma frase sua.

          — Hum! Tudo mais ou menos na medida do impossível, né, Dudu?!

          — Caramba, Don Marcito! Que frase legal!

  • Nota de esclarecimento: A crônica "As frases que roubo do Marcio Petracco" foi publicada por Notibras no dia 6/10/2025.
  • https://www.notibras.com/site/as-frases-que-roubo-do-marcio-petracco/

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