Enquanto transito entre o Rio, Brasília e o bairro do Menino Deus, em
Porto Alegre, fico atento a qualquer dica que, de repente, possa se tornar um
conto ou uma crônica que me faça insuflar o peito e dizer: "Amorzinho,
olha aqui o que acabei de gestar!" É verdade que nem tudo são flores, isto
é, o parto nem sempre ocorre de maneira tranquila. Não raro, é preciso usar até
fórceps para que a história nasça. Vida de escritor não é fácil. Ou você pensa
que é só abarrotar uma folha com um monte de palavras?
Um passeio com minhas buldogues, a Bebel e a Clarinha, ou,
então, uma ida ao parquinho com a minha caçula, a Malulinha, me ajudam no
processo de ruminação do texto. O que quero dizer é que preciso dar um tempo
para, assim, possibilitar a história e, muitas vezes, a ideia inicial do
desfecho nem existe ou, então, quando há uma, acontece de encontrar outra no
meio do caminho, como se a vida fosse bolinha de gude descendo uma enorme
escada tão íngreme, que nada está definido até o espirro final.
Voltando ao Petracco, a quem costumo chamar de Don Marcito, vez
ou outra o encontro no cachorródromo do Tesourinha, onde o Cacau e o Coco, os
cães do meu amigo, brincam com as minhas meninas de cara achatada. Enquanto a
garotada focinhuda se diverte, me delicio com os inúmeros causos do Marcio. E,
como não sou bobo, sempre estou com um bloquinho de notas e uma providencial
caneta no bolso.
Já me perguntaram qual é o meu texto mais
lido. Bem, realmente não sei. Entretanto, o mais premiado é O pai do rock
foi um péssimo caçador, que até hoje me gera dúvida se é uma crônica ou um
conto. Esse texto já foi agraciado como a melhor crônica pela UFSCar, ganhou
uma medalha da CAPOLAT, além de compor o meu livro 57 Contos e crônicas
por um autor muito velho, que venceu o Prêmio Literário Clarice Lispector/20205
na categoria contos.
Não sei se é pelo fato do Don Marcito e eu
degustarmos o mesmo signo (Aquário), com um ano e um dia de diferença entre os
nossos aniversários ou, talvez, seja algo que nem os astros expliquem. Todavia,
sei que tem algo aí, já que o meu parceiro tem o dom de me iluminar as ideias
quando sai uma frase mágica de seus lábios tão acostumados a cantar rock. O
fato é que, invariavelmente, a trama se desenha quase que imediatamente na
minha mente, como se cada palavra se ajustasse para que, assim que eu retorne
ao lar, doce lar, me sente em frente ao computador e, em questão de minutos, a
história está pronta.
Foi assim com O pai do rock foi um
péssimo caçador e tantas outras. Mas eis que, quando eu mando para o Don
Marcito o que acabei de escrever, ele ainda tem a cara de pau de me mandar
essa:
— Que história legal que a gente fez, Dudu!
— Ei, peraí! Roubei apenas uma frase sua.
— Hum! Tudo mais ou menos na medida do
impossível, né, Dudu?!
— Caramba, Don Marcito! Que frase legal!
- Nota de esclarecimento: A crônica "As frases que roubo do Marcio Petracco" foi publicada por Notibras no dia 6/10/2025.
- https://www.notibras.com/site/as-frases-que-roubo-do-marcio-petracco/
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