quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Joaquim e as cartas

       Joaquim das Couves adorava cartas. Aliás, antes que alguém possa pensar que seu nome era mesmo esse, já lhe digo que não. Chamava-se Joaquim Manoel de Almeida. No entanto, como era dono de uma banca de frutas e legumes na feira, acabou ganhando essa alcunha, que carregava por todos os cantos. Vendia ovos caipiras também. Mas, como já havia o Zé do Ovo bem ali na outra barraca, ficou das Couves mesmo.

          A despeito de couves, cenouras, tomates, alfaces e ovos caipiras, Joaquim gastava seu tempo livre com algo fora de moda. Apaixonado desde sempre por cartas, pegava uma boa quantidade de folhas e danava a derramar um monte de palavras sobre elas. Caprichosamente delineadas, pois não queria causar dúvida ao destinatário quanto aos dizeres. Jota era jota, gê era gê, todos os emes com três perninhas. Quanto aos enes, cabiam-lhes apenas duas. 

          É verdade que quase não mais recebia missivas, mas isso não o desanimava. Final de tarde, o homem se sentava à mesa da sala e, rodeado dos apetrechos necessários, tratava logo de escrever, escrever, escrever. E, caso as ideias lhe faltassem, bebericava o café ao lado, cuidadosamente preparado no antigo coador de pano. Não se sabe se era por hábito ou milagre, mas os pensamentos lhe corriam que nem os caudalosos rios em direção ao mar. 

          De vez em quando, Joaquim consultava aquele calhamaço, que havia ganho de presente de um antigo funcionário dos Correios, em busca de um CEP. Colocava os óculos e os empurrava até a ponta do nariz. Virava as folhas fininhas, enquanto o indicador fazia uma busca até a almejada linha. Pronto! Anotava cuidadosamente no verso do envelope: 90150-002. 

          Às segundas-feiras, dia de folga no trabalho, juntava aquelas dezenas de envelopes e caminhava até a agência dos Correios. Como se tratava de hábito, bem que poderia comprar um monte de selos, colá-los e despachar as cartas numa caixa mais próxima. Não! Fazia questão de esperar na fila e ser atendido por qualquer um dos funcionários. Não importava qual, pois todos o conheciam de longa data.

          — Como vai, seu Joaquim?

          — Oi, Marcos. Tudo bem. E com você?

          — Tudo bem também. Vejo que hoje temos 34 cartas. Parece que o senhor vai ter muita coisa para ler quando receber as respostas.

          Joaquim sorria por hábito. Na verdade, há mais de dois anos não recebia uma carta sequer. De vez em quando, sejamos justos, recebia o telefonema de algum destinatário ou mensagem via algum aplicativo eletrônico. Nada além disso.

          O feirante voltou para casa pelo caminho de costume. Passou no mercadinho da esquina e comprou um pacote de pó de café. Do melhor, praticamente a única extravagância de uma vida tão simplória. 

          Assim que abriu a porta da residência, notou um envelope diferente junto a tantas contas para pagar. Olhos arregalados, pensou que aquilo era um sonho. Não era possível! Uma carta! 

          O homem não reconheceu o nome da remetente. Mas o sobrenome era conhecido. Fabiana Moretti. O endereço era o mesmo do seu amigo de juventude, Bruno, na longínqua cidade natal. Fabiana, certamente, era uma parenta. 

          Joaquim, de tão emocionado, depositou cuidadosamente a missiva sobre a mesa. Foi até a cozinha, colocou água na chaleira. Passou uma boa quantidade de café. Voltou à sala, sentou-se à mesa, despejou o líquido fumegante até a metade da xícara de louça florida. Deu um gole, mordeu o bigode com os lábios trêmulos, respirou profundamente.

          Pegou seus óculos e os colocou como de costume. Com a carta em mãos, abriu cuidadosamente o envelope. Desdobrou as três folhas, como se desembrulhasse um presente há tanto esperado. 

          Já nas primeiras linhas, percebeu que Fabiana era uma das filhas de Bruno. Este, infelizmente, havia falecido há pouco mais de seis meses, após quase dois de ter entrado em coma. Joaquim se sentiu tocado pela partida do amigo, que jamais havia lhe respondido, a não ser por um ou dois telefonemas ao longo dos últimos cinco anos. Algumas lágrimas escorreram pelo rosto enrugado ao ler um trecho da carta.

          Sei que o senhor foi muito amigo do meu pai. Como sei disso? Bem, todas as vezes que lia alguma das suas cartas em voz alta, meu pai, mesmo em coma, sorria com lágrimas nos olhos.

  • Nota de esclarecimento: O conto "Joaquim e as cartas" foi publicado por Notibras no dia 31/10/2024.
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Finalmente, um dia de sorte!

        

      Gecileine dos Santos, cuja ausência do sobrenome do pai, não declarado que era, poderia ser Pobreza. Que fosse miséria, que, afinal, condizia com a situação de penúria que a mulher conhecia desde que se conhecia por gente. Gente? 

          Ser humano de segunda classe, isto é, se tivesse alguma, Gecileine comeria de bom grado o pão que o diabo amassou. Ao menos, seria algo para forrar o estômago. Os crédulos diriam que a mulher ainda estava vida por um milagre. Quanto aos incrédulos, afirmariam que era simples obra do acaso. Seja como for, esses dois grupos tinham algo em comum: ninguém ligava para as agruras, que eram inúmeras, da quase moribunda. 

          A pobretona, afinal de contas, seguiu os passos da mãe. Engravidou, e o quase cônjuge escafedeu-se para não se sabe onde. Um traste por assim dizer. Seja como for, Gecileine não tinha tempo para reclamar, pois a barriga crescia a cada semana. E foi o que ela fez.

          Já com sete meses de gravidez, Gecileine conseguiu um trabalho de um dia. Um dia, mas que lhe renderia o suficiente para passar um mês inteiro. Não que fosse grande quantia, mas era muito mais do que ela estava acostumada a receber.

          Cozinheira! Era essa a função que Gecileine havia conseguido. Apesar da ironia dela ser contratada para encher o bucho de um grupo enorme de pessoas, enquanto sua própria existência tinha sido repleta de fome, a mulher até que sabia juntar os ingredientes de modo convincente, desde que os paladares não fossem tão exigentes.

          Boca-livre! Era um evento de um afamado político ali na região do Cariri, que queria se eleger pela enésima vez. E o homem gostava de esbanjar, tanto é que mandou matar dois bois para alimentar aquela quantidade enorme de eleitores. Ainda bem que Gecileine contava com três ajudantes na cozinha, pois era tanta comida, e o candidato precisava conseguir os votos necessários.

          Lá pelas tantas, panelas fervendo, o cheiro dos pratos foi se espalhando pela enorme propriedade, o que deixou o povo alvoroçado. Não tardou, os inúmeros garçons começaram a entrar e sair da cozinha para servir toda aquela gente. E, enquanto as pessoas devoravam aquele monte de comida, o anfitrião fazia o discurso.

          — No meu governo vai ser assim! Fartura para todos!

          E o público aplaudia de boca cheia.

          Já perto do final do evento, Gecileine conseguiu se sentar e devorar dois pratos. A fome era imensa, e o bebê a caminho necessitava. Ela olhou ao redor e percebeu que todos os outros contratados haviam saído do recinto. 

          Gecileine constatou que o dono da casa havia exagerado na quantidade de ingredientes. Gordos que eram os bois, bastava um para alimentar aquele mundaréu de convidados. Foi aí que ela, diante de duas peças inteiras de carne, resolveu escondê-las debaixo da roupa. 

          Colocou uma. Olhou para a direção da porta, ninguém percebeu. Tomou coragem e logo estava com aquela quantidade enorme de carnes forrando a sua barriga, que já despontava. Quem a visse naquele momento, certamente diria que estava prestes a parir. 

          A grávida pensou em colocar mais alguma coisa debaixo da roupa, quando, de repente, o anfitrião entrou na cozinha. Imediatamente, Gecileine se virou para o rumo da pia e começou a lavar alguns pratos. Teria o homem percebido?

          — Qual é mesmo o seu nome, mocinha?

          — Gecileine.

          — Pois deixe isso aí, que não te contratei pra lavar louça. 

          Gecileine ficou paralisada. Teve certeza de que o patrão por um dia a iria mandar embora. Pior! Tão poderoso que era, certamente ordenaria que a prendesse por furto. Ele se aproximou e a puxou pelo braço.

          — Vem dançar comigo, moça!

          O forró comendo solto, lá estava aquele casal improvisado, corpos colados, quando o sujeito se afastou.

          — Você está com a roupa toda molhada, mulher!

          Gecileine, agora não tinha a menor dúvida, havia sido descoberta por causa do líquido que a carne soltava. Sairia dali direto para a delegacia. O homem era poderoso. Ela passaria todo a sua desgraçada vida na cadeia.

          — Tá aqui o seu dinheiro. E toma mais este aqui, que o pessoal elogiou muito a sua comida. E pode pegar aquelas duas sacolas ali no canto e encher de carne. 

          A cozinheira, incrédula, obedeceu e, antes que saísse, ouviu mais essa:

          — Gecileine, é esse o seu nome, né?

          — Sim, senhor.

          — Pois quero você aqui de novo pra fazer a comida da minha vitória nas eleições.

  • Nota de esclarecimento: O conto "Finalmente, um dia de sorte!" foi publicado por Notibras no dia 31/10/2024.
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quarta-feira, 30 de outubro de 2024

O pitéu

          

        Júlia era um pitéu! Aliás, arrogantemente deliciosa, como Augusto, um dos tantos admiradores, havia notado. O gajo era, na verdade, um privilegiado. Não que tivesse qualquer chance com a beldade. É que ele morava no prédio defronte do dela.

          Melhor ainda. O apartamento do Augusto ficava um andar acima, o que lhe dava visão privilegiada do dia a dia da Júlia. Esta, talvez até para provocar um enfarte no vizinho octogenário, vez ou outra, desfilava apenas de calcinha e sutiã. Que morresse, mas de modo digno!

          Aos 34 anos, caminhava firme pelas calçadas, enquanto uma horda de marmanjos babava. Os pés da moçoila, confortavelmente acomodados num chamativo par de tênis verde-limão, decididos que eram, iam e voltavam da academia na esquina. Alguns, mais atrevidos, a cumprimentavam com sorrisos embasbacados. 

          Rômulo, um dos mais velhos do local, até cogitou a ideia de se matricular, pois já não conseguia esconder a barriga todas as vezes que Júlia passava. Todavia, preferia não arriscar ter um enfarte levantando pesos e fazendo caminhadas sem sentido na esteira. Se iria morrer, que fosse comendo torresmo e tomando uma gelada no botequim do Joca. 

          Certa feita, um conversível estacionou em frente ao prédio de Júlia, que, não tardou, apareceu na janela e deu um tchauzinho. Todos notaram, ainda mais porque um velho, que tinha no mínimo idade para ser avô da lindona, desceu do veículo. Pior, ele foi em direção à portaria, entrou e, alguns minutos após, já estava no interior do apartamento da mulher mais desejada da região.

          O idoso, que usava uma bengala, foi até a janela e percebeu que um outro velho, no apartamento do edifício em frente, o encarava. Sem qualquer cerimônia, o ancião de cá fechou a janela, o que instigou a curiosidade do Augusto. O que aquele ser decrépito estaria fazendo justamente no apartamento da Júlia? Seria um amante rico? 

          A fofoca se espalhou por todo o bairro, ainda mais porque ninguém sabia ao certo o que estaria acontecendo atrás das cortinas. Quase duas horas após, eis que o idoso de bengala saiu pela portaria, entrou no veículo e, antes de partir, ainda acenou para a pantera na janela. Ela, por sua vez, beijou a palma da mão e soprou em direção ao, agora todos tinham certeza, amante.  

            Ninguém falava de outra coisa. Júlia, com todos aqueles atributos, havia mesmo se metido com um homem tão ou mais velho do que todos ali na região. Isso, aliás, despertou esperanças naqueles machos envelhecidos. Se ela namorava um senhor de pra lá de 80 anos, qualquer um dali teria chance de se aninhar nos braços da gatona. 

            A partir de então, Júlia passou a ouvir cantadas daqueles que, até há pouco tempo, eram apenas babões e nada mais. A princípio, ela achou graça, até que, talvez por conta dos dias do mês, começou a dar patadas. Não raro, saía um ou outro palavrão daqueles lábios carnudos.

            Um dia, porém, Júlia surgiu vestida de preto. Triste que estava, foi consolada por uma idosa, que, até então, era desconhecida dos moradores dali. Denise, vizinha do andar da moça, ficou intrigada. O que teria acontecido?

              Investiga daqui, investiga dali, a futriqueira acabou descobrindo. Aquela velha era a avó da Júlia. O motivo do luto? Ah, é que o homem do conversível havia falecido. Ele, afinal, era o avô da bonitona.

  • Nota de esclarecimento: O conto "O pitéu" foi publicado por Notibras no dia 30/10/2024.
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terça-feira, 29 de outubro de 2024

Veridiana, Horácio e Cassiana

 

        Era notória, naqueles cantos, a paciência dos urubus, por mais ansiosos que estivessem, em esperar por mais uma criatura faminta ou, então, acometida de alguma moléstia finalmente sucumbisse. Ajoelhada e sem vontade de rezar, Veridiana olhou aquelas aves e teve a certeza de que os sonhos de infância não passaram de devaneios de alguém que não conseguia enxergar a própria sina. 

          Com as palmas das mãos sobre o solo rachado da caatinga, a mulher soltou um arre e conseguiu erguer o corpo. Nunca fora boa com números, mas sabia que havia um povoado a duas léguas. Que fossem sete ou oito, ela estava decidida a não virar repasto de urubu. Não naquele dia. Que fossem procurar por outra carcaça com menos vontade de prosseguir nessa sobrevida ingrata.

          Aos 38 anos, passara por momentos de penúria e raros confortos. Desde sempre fora explorada, seja pelo pai, seja pelos irmãos, seja pelo homem que se fez seu marido. Seca nas carnes e por dentro, nunca engravidou, apesar das indesejadas investidas do macho que a cobria sem lhe dar sossego. 

          Horácio não se conformava por escolha tão despropositada. Para que servia mulher estragada, se não era capaz de lhe dar os filhos que tanto queria? Pois tratou de arrumar uma mais nova e de procedência garantida. 

        Cassiana, a vizinha, era viúva e sustentava dois meninos graúdos. O homem foi ter um dedo de prosa e a coisa ficou acertada. Divorciou de Veridiana e desposou a outra. Não tardou, constatou que a escolha havia sido acertada, pois a nova esposa logo apresentou os primeiros enjoos. 

         Quanto à Veridiana, foi colocada de lado para os afazeres domésticos. Perdera o posto de esposa, mas Horácio necessitava de alguém para ajudar a nova mulher na lida com a casa. Vez ou outra, dependendo da falta de disposição da Cassiana, deitava-se com a ex-consorte. Rosto virado para o lado ou fixo no teto, Veridiana aguardava o arfar do sujeito se esvair num urro. Coisa de minutos, que pareciam uma eternidade. 

        Enquanto caminhava, Veridiana se recordava da vida miserável que se acostumou a levar. Não tinha raiva de Cassiana, muito menos das crianças e do bebê a caminho. Eram todas vítimas da perversidade do inferno onde nasceram. E nada de indulgências para os desprovidos de sorte. Que cumprissem as próprias agruras. 

        Horácio, todavia, não era visto com qualquer benevolência. Tanto é que Veridiana decidiu pôr um ponto final não apenas nas investidas do gajo, como também fazê-lo pagar por todos os pecados. Ela pensou numa maneira que não levantasse suspeitas.

        Após quase dois meses, eis que Veridiana percebeu que o melhor era envenenar o traste. Que ele gostava de doces, todos sabiam. Que morresse empanturrado de quebra-queixo!

            Tentou antúrio, mas não conseguiu provocar nada além do que diarreia e vômito no homem. Abusou de óleo de mamona, mas tratou de jogar fora todo o tacho porque os meninos e a buchuda reclamaram seu quinhão. 

            — Estragou.

            — E desde quando doce estraga?

            — Pois esse estragou. Faço outro amanhã.

           A desculpa parece que não convenceu Cassiana, mas nada que provocasse intriga entre as duas. Quanto às crianças, foram ludibriadas por generosos nacos de rapadura. 

            Os dias prosseguiram, até que, por algo tão inesperado como picada de cobra, eis que Horácio, ao acordar depois de passar mais uma noite sobre Veridiana, foi calçar a botina. Pelo barulho do chocalho, parece que foi cascavel, que buscara refúgio no caldado do homem. 

                Veridiana nunca sentiu tamanho regozijo ao encarar o desespero de Horácio, que gritava. Não tardou, Cassiana surgiu e ainda pode ver a serpente se esgueirando para debaixo da cama. As duas mulheres, cúmplices nos desejos, viram o homem se esvair em pouco mais de duas horas.

                — Vá buscar ajuda!

                — Vou.

                Cansada pela longa caminhada, Veridiana, finalmente, chegou ao povoado, onde sabia não existir médico. Tratou de comunicar o ocorrido ao padre, que acompanhou a mulher até o sítio da família. Nem deu tempo de fazer a extrema unção. Horácio, tipo comum da região, tinha um filete de sangue ressequido no canto dos lábios. 

  • Nota de esclarecimento: O conto "Veridiana, Horácio e Cassiana" foi publicado por Notibras no dia 29/10/2024.
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Sarita, a moça das belas coxas

    

        Sarita, desde menina, se destacava das outras crianças pelas coxas grossas, herdadas certamente da mãe, já que o pai possuía um par de cambitos, que pareciam dois gravetos prestes a se quebrar. Criança que era, não ligava para tamanho atributo. Queria correr, pular, brincar com a gurizada da rua. 

          Veio a adolescência e, com ela, certo incômodo por tantos olhares, alguns de inveja, outros tantos de admiração. Tanto é que Sarita, no afã de querer esconder o que lhe era mais belo, abandonou as saias e os shortinhos. Apenas vestidos castos e calças folgadas para não mostrar aquele par de colunas torneadas, que fariam Michelangelo desejar eternizar em mármore. 

          Aos 20, começou a enxergar com outros olhos aquela perfeição que sustentava seu corpo, que também fazia jus à alcunha de Deusa da Luxúria, que fora dado por um dos tantos admiradores. Seu nome, aliás, era Aníbal, um pintor de quadros sem muito talento, mas repleta imaginação. 

          O homem, um solitário por natureza, trabalhava no cartório ali da Asa Norte. E, por conta desses acasos da vida, Sarita precisou de um favorzinho para conseguir documentação para resolver pendenga de pouca monta. E lá foi a moçoila tentar a segunda via de uns papéis. O problema é que a garota, certamente por desconhecimento, não sabia que não era naquele, mas sim no cartório de Taguatinga, conforme lhe explicou a atendente. 

          Triste com a descoberta, Sarita já estava quase conformada que precisaria gastar um bom tempo para se deslocar até a cidade satélite, quando, surgido não se sabe de onde, apareceu o Aníbal. Ela o conhecia de algum lugar, mas não se recordava de onde, apesar de serem vizinhos de porta no edifício ali na 709 Norte. Por sorte, ele escutara o que a colega havia dito para Sarita. 

            — Vou dar um jeitinho. Tenho um amigo que trabalha no cartório de Taguatinga. Ele me deve alguns favores. Você pode passar aqui na sexta-feira para pegar a sua certidão.

            Sarita, pega de surpresa, agradeceu.

            — Muito obrigada. De onde mesmo nos conhecemos?

            — Somos vizinhos.

            A garota tentou disfarçar a surpresa por tamanha revelação. Estendeu a mão para Aníbal e, em seguida, saiu desfilando toda aquela exuberância.

            Na sexta-feira seguinte, conforme combinado, a documentação chegou às mãos de Aníbal. Só que Sarita, a maior interessada, parece que se esqueceu, pois não apareceu no cartório. O homem pensou que, talvez, ela fosse aparecer na segunda-feira, coisa que não aconteceu. Nem na terça ou mesmo na quarta. Chegou a sexta-feira e nada da Sarita.

            Aníbal, decidido, pegou o documento e o meteu num envelope. Não custava nada entregá-lo em mãos para Sarita. Afinal, eram vizinhos. 

              Assim que chegou ao prédio, o rapaz se dirigiu ao apartamento em frente ao seu. Não tardou, Sarita abriu a porta com o sorriso mais lindo. Ela agradeceu e perguntou quanto era pelo serviço. Aníbal disse que não era nada, momento em que a mulher já ia fechando a porta, mas, defronte que estava ao apartamento do gajo, percebeu algumas telas.

                — Você é pintor?

                — Sou. Quer dizer, gosto de pintar, mas nunca consegui vender um quadro.

                Sarita, talvez por gratidão ou, então, por pena, disse que as pinturas eram boas. Chegou ao exagero de classificar como obras de arte, especialmente a imagem de uma mulher de biquíni na piscina. 

                — Quem é?

                — Ah, essa é uma ex-namorada.

                — Bonita.

                — É.

                — Você bem que poderia me pintar.

              Aníbal ficou maravilhado com a proposta da sua Deusa da Luxúria. E, para não perder a chance, disse que poderia começar a pintá-la naquele momento. Sarita, toda envaidecida, concordou.

           Meia hora após, lá estava a mulher apenas de blusa e shortinho minúsculo sentada em um banco alto. O artista, suando em bicas, procurava captar cada centímetro daquele mulherão. Nisso, Sarita, percebendo que Aníbal não tirava os olhos de suas pernas, disse:

                — Ei, taca tinta aí! Mamãe sempre me disse que nasci rica das coxas.

  • Nota de esclarecimento: O conto "Sarita, a moça das belas coxas" foi publicado por Notibras no dia 29/10/2024.
  • https://www.notibras.com/site/sarita-de-belas-coxas-vira-a-deusa-da-luxuria/

segunda-feira, 28 de outubro de 2024

Santana e o bêbado

    

             O Santana, só para variar, andava com o costumeiro mau humor. De tão emburrado, os colegas da delegacia afirmavam, e sem qualquer resquício de dúvida, que o mais preguiçoso policial não largaria a notória rabugice nem se estivesse sonhando que tomava um sorvete de morango numa praia paradisíaca. 

          E lá estava o taciturno com todo aquele azedume em mais um plantão numa das mais movimentadas delegacias da cidade. Sem papas na língua, Santana já havia despachado duas velhinhas que foram registrar extravio de documentos. O policial, logo em seguida, levantou o traseiro gordo da cadeira e disse que faria uma ronda na região. Que nada! O glutão foi filar um sanduíche na padaria da esquina.

          De barriga cheia depois de devorar não um, mas três mistos-quentes, duas coxinhas e meio litro de refrigerante, Santana, já na calçada, avistou um homem sentado no meio-fio. Ao lado, uma garrafa de cachaça pela metade. Era nítida a embriaguez do sujeito, tanto é que o policial se aproximou e quis enquadrá-lo.

          — Cidadão, pelo visto, o senhor está alcoolizado.

          — E por acaso é proibido beber, seu policial?

          — Hum... Depende.

          — Depende do quê?

          — Esse carro estacionado é seu?

          — Sim.

          O Santana foi até a viatura, pegou o bafômetro e retornou.

          — Assopra aqui.

          O homem obedeceu e, depois de assoprar, ouviu algo que o deixou boquiaberto.

            — O senhor está bêbado e, por consequência, tenho que prendê-lo por embriaguez ao volante. Então, entre no seu carro e me acompanhe até a delegacia.

          O agora preso novamente obedeceu ao comando do policial e, então, dirigiu seu veículo até a delegacia. Após estacionar o carro, o homem foi algemado e conduzido até o delegado Rafael Miranda. No entanto, assim que soube da história, a autoridade berrou com o seu subordinado.

          — Santana, que lambança é essa? Então, quer dizer que você mandou o sujeito embriagado entrar no veículo e dirigi-lo até aqui? 

          O delegado, então, pediu desculpas ao homem pela atitude do policial e o mandou ligar para alguém ir buscá-lo na delegacia. Não havia flagrante para ser registrado, a não ser a flagrante falta de noção do Santana, que passou o resto do plantão com a cara fechada. 

  • Nota de esclarecimento: O conto "Santana e o bêbado" foi publicado por Notibras no dia 28/10/2024.
  • https://www.notibras.com/site/policial-usa-bafometro-prende-motorista-e-manda-que-ele-dirija-a-delegacia/

sábado, 26 de outubro de 2024

Evelina, a farra e o Detran

Evelina, gata até dizer chega, há muito aceitara a sina de ser notada por onde passava. E como passava! Aliás, desfilava um turbilhão de sensualidade digna daquela outra, a tal Grabriela de um certo Jorge, tão amado pelo mundo. 

Apesar de tantos atributos que roubavam todos os olhares, sejam de desejos, sejam da mais pura inveja, a mulher andava às turras para desvendar os mistérios da condução de automóveis. Era uma coisa de passar marcha daqui, marcha dali, engatar a ré, pisar no freio, fazer controle de embreagem e, se deixasse, Evelina pisava fundo no acelerador. E sai da frente!

A beldade, após ser reprovada pela quarta vez na prova de habilitação, estava decidida a vencer tamanho desafio. De tão empenhada, acabou por abandonar quase por completo as farras. Quase. É que nem sempre dava para fugir da paixão por uma boa patuscada. 

A despeito da louvável força de vontade da Evelina, ela não conseguiu se desvencilhar da bambochata promovida pela Ana Paula, amiga de esbórnia dos tempos de adolescência. Regada a cerveja e samba de primeira, caiu no começo da noite internacional da frascaria. Sexta-feira!

E lá foi a moçoila para o rega-bofe na casa da companheira de longa data. O problema é que, no dia seguinte, a Evelina enfrentaria mais uma prova de direção. Ademais, entre tantos pratos servidos, ela se interessou mesmo foi por um gajo de belos olhos castanhos e sorriso de fazer qualquer mocinha direita perder o juízo. Não que fosse o caso dela, mesmo porque juízo era coisa dos tribunais, e a Evelina era da matemática.

Lá pelas dez da noite, a poderosa já havia perdido as contas dos copos de cerveja, sem contar as duas ou três tequilas. Sob o efeito do álcool, a libido da mulher foi às alturas. Tanto é que se deixou carregar pelos braços do Ivan, o tal rapaz de bela aparência. 

Já devidamente acomodado no quarto de hóspede, o casal teve uma noite daquelas. Após refestelarem-se, os pombinhos adormeceram de conchinha, o que indicava o prenúncio de que haveria repeteco quando o dia amanhecesse. Que nada! Assim que Evelina despertou, olhou para o relógio e percebeu que, caso não corresse, iria perder a chance de, finalmente, ter a sua tão almejada carteira de motorista. 

Saltou da cama, vestiu-se numa ligeireza que, caso houve essa modalidade nos jogos olímpicos, certamente seria medalha de ouro. Em seguida, correu para o ponto de ônibus. Por sorte, o coletivo não demorou a passar. E, meia hora após, Evelina chegou ao local da prova do Detran. Um pouco atrasada, é verdade, mas nada que a impedisse de fazer o teste, mesmo porque vários outros aspirantes à motorista formavam uma fila enorme.

Evelina aguardou pacientemente até ser chamada para entrar no automóvel. Os instrutores, já passados dos 50, receberam a candidata com bons olhos, talvez na vã esperança de que algo pudesse acontecer. A mulher, no entanto, não pareceu perceber aqueles olhares carregados de desejos, já que, assim que se sentou ao volante, algo começou a incomodá-la na parte debaixo da coxa esquerda.

A rainha da beleza ligou o veículo, pisou na embreagem, passou a primeira marcha quando, algo inesperado aconteceu. O incômodo começou a descer pela perna, indo parar justamente na barra da calça. Não se sabe se foi por milagre ou, então, por estar com todo o medo voltado para aquela coisa que estava dentro pela calça, Evelina conseguiu fazer o percurso sem qualquer falha. Enfim, aprovada!

Evelina recebeu a notícia sem muito entusiasmo. É que ela não conseguia deixar de pensar naquela coisa que ainda estava presa ao seu calcanhar, até que, por fim, a mulher reconheceu a coisa vermelha que começou a sair sobre seu tênis: a calcinha.

  • Nota de esclarecimento: O conto "Evelina, a farra e o Detran" foi publicado por Notibras no dia 26/10/2024.
  • https://www.notibras.com/site/evelina-consegue-cnh-apos-farra-regada-a-tequila/

sexta-feira, 25 de outubro de 2024

O dueto e o duelo

        Ao contrário do pai, música nunca fora uma parte muito presente na vida de Anibal. Claro, ele tivera de decorar o Hino Nacional nos tempos de escola. Também se lembrava de algumas marchinhas, mesmo nunca tendo sido frequentador habitual de bailes de carnaval.

Nem mesmo as interpretações teatrais de Cauby Peixoto conseguiu despertá-lo para essa arte. Gostava de Altemar Dutra, mas nada além de certa admiração por alguém que soube fazer um bom trabalho usando a voz.

Sim, ele apreciava o timbre agradável da voz de Altemar. E nada mais. Música, para ele, era apenas um apêndice da vida que muitas pessoas cismavam em dar uma importância muito além do razoável.

          No entanto, nem mesmo esse quase descaso foi impedimento para notar as canções que vinham de algum aparelho de som do apartamento em frente. O cantor era conhecido, aliás, mais do que conhecido, mesmo para alguém tão à margem da música como Anibal.

          Sempre no mesmo horário, aquele barítono tomava conta do ambiente. E uma voz feminina fazia um belo dueto com o cantor de voz rouca. Anibal não conhecia propriamente a dona de tão bela voz, mas já havia cruzado com ela umas duas ou três vezes no corredor ou no elevador. Devia ter no máximo 28, 30 anos, se bem que o velho nunca houvera prestado muita atenção, mesmo porque a moça havia se mudado há pouco tempo para o prédio.

Sabia apenas que era jovem e morava com uma senhora, possivelmente a mãe ou, então, uma tia, uma amiga ou qualquer coisa que o valha. Sabia que era a jovem do dueto, pois certa vez encontrara a mulher que dividia o apartamento com a tal no exato momento em que esta soltava a voz na feliz tentativa de acompanhar o famoso cantor.

          Na verdade, não estava interessado na garota, mesmo porque há muito Anibal deixara de se interessar por romances, ainda mais com uma quase criança, tão jovem que ainda era possível sentir o cheiro do leite materno em suas ventas. Exagero, alguém poderia dizer. Talvez, mas não se levarmos em consideração o disparate das idades dos dois. Um romance com aquela mulher tão jovem seria simplesmente ridículo! E Anibal poderia ser tudo na vida, mas jamais ridículo. Pelo menos, não a tal ponto.

          Seja como for, certa noite os caminhos do velho e da jovem rebenta se cruzaram novamente. Depois de uma partida de xadrez com Nilson, onde a sorte não havia estada ao lado de Anibal, aconteceu aquele que poderia ser chamado de fato que mudou definitivamente o destino de um homem.

          — Boa noite – Anibal cumprimentou duas senhoras na entrada do edifício onde morava, Depois seguiu para o elevador, mas desistiu.

 

Naquele dia, quis experimentar as escadas, talvez como uma homenagem ao falecido pai, que costumava tomar esse rumo de vez em quando. Os degraus foram vencidos um a um.

O homem pensou em desistir e continuar sua trajetória para o lar de elevador. Pensou novamente no pai, insistiu nos degraus, apesar das dores que o castigavam. E lá foi o ancião arrastando a carcaça maltratada por décadas de descaso.

          — Afinal, o que você quer? Pensa que eu não vi você paquerando aquela piranha da Aline? – a vizinha de Anibal está furiosa com o namorado.

          — Você tá louca, Karina! Eu apenas quis ser gentil com ela – o namorado tentou uma desculpa, mas parece que não estava surtindo o efeito desejado.

          — Gentil? Você é um canalha! Gentil? Só me faltava essa! Não sei onde você arruma tanto óleo de peroba pra passar nessa sua cara-de-pau, Jorge.

          — O que é isso, benzinho?

          — Benzinho? Ah, garoto, vê se cresce! E aproveita e também desaparece da minha vida!

          Nesse exato momento, Jorge pegou o braço de Karina. Ele o apertou com força, o que fez a moça soltar um “ai”. Anibal apareceu e acabou se intrometendo. Ele sabe que não é boa ideia se meter em briga de casal, mas a sua índole não lhe permitiu ver uma mulher ser subjugada pela força bruta e, por isso, como um Don Quixote, entrou em ação.

          — Ei, solte a moça!

          — Ah, vai ver se estou lá na esquina, vovô! – Jorge olhou Anibal apenas de relance e apertou ainda mais forte o braço de Karina, que lhe implorou para soltá-la.

          — Ai! Você está me machucando, Jorge! É melhor você me largar! – Karina ameaçou, mas sem muita convicção do que disse.

          Anibal não resistiu e avançou em direção ao agressor. O seu oponente, além de muito mais jovem, é pelo menos 10 centímetros mais alto e bem mais forte. Jorge, ainda segurando o braço de Karina, empurrou o velho, que foi ao chão, bateu a cabeça na parece e caiu desacordado. Karina finalmente resolveu cumprir a tal ameaça e, então, com a perna direita, desferiu um chute na parte interna da perna direita de Jorge, desestabilizando-o. Em seguida, a jovem acertou uma joelhada nas partes baixas do namorado; depois lhe aplicou uma rasteira e, por fim, já com o oponente caído, desferiu-lhe um pisão no estômago, ao mesmo tempo que soltou um kiai, grito da guerreira.

 

Jorge ficou se contorcendo em dores, enquanto Karina foi em socorro do Anibal. Ela até pensou em entrar, mas antes mesmo de fechar a porta de casa, voltou a olhar o Don Quixote nocauteado e veio ajudá-lo. Anibal pareceu já estar retornando do breve sono.

          — O senhor está bem?

           — ... – nenhuma palavra, Anibal apenas vislumbrou a linda face oriental diante do seu rosto carcomido pelo tempo.

          — Venha, deixe-me ajudá-lo a se levantar. O senhor mora aqui em frente, não é? – Karina perguntou o óbvio, mesmo porque ela já havia encontrado aquele mesmo velho algumas vezes.

          A moça nem percebeu que, nesse ínterim, Jorge se levantou, observou a cena e, cambaleante, tirou o time de campo acompanhado do orgulho mais que ferido. Como um leão açoitado pela leoa, foi lamber suas marcas da batalha perdida bem longe dali. Quanto ao idoso, constatou que fora salvo pela mocinha da história.

  • Nota de esclarecimento: O conto "O dueto e o duelo" foi publicado por Notibras no dia 25/10/2024.
  • https://www.notibras.com/site/anibal-velho-cavalheiro-enfrenta-escada-e-fanfarrao/

quinta-feira, 24 de outubro de 2024

Noibras desperta em alunos da rede pública interesse por literatura (matéria escrita por Cecília Baumann)





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Fazendo história

Notibras desperta em alunos da rede pública interesse por literatura

Publicado

 
Autor/Imagem:
Cecília Baumann - Foto Acervo Pessoal

Alunos do Centro de Ensino Fundamental 102 Norte (CEF 102 Norte), na Asa Norte, há três anos utilizam contos e crônicas do escritor Eduardo Martínez, cujos textos são publicados diariamente aqui em Notibras na editoria Quadradinho em Foco. Essa iniciativa partiu do professor Leandro Mendes, grande entusiasta da literatura nacional.

Eduardo esteve recentemente no CEF 102 Norte e conversou com várias turmas. Nesse encontro, foi proposto pelo professor Leandro que os estudantes criassem textos literários falando sobre aquele momento. E, entre tantos maravilhosos contos, crônicas e poesias produzidos, um chamou a atenção do escritor, que, emocionado, me confidenciou: “Ceci, olha o que a Eloá, uma menina de apenas 11 anos, escreveu em menos de 20 minutos.”

Eloá Dias Leal Farias, aluna do 6º Ano do CEF 102 Norte, é a prova de que o trabalho do professor Leandro já deu certo. Não sabemos se a pequena poetisa irá prosseguir no ofício da escrita. No entanto, talento não lhe falta.

Veja a seguir o original na folha do caderno e a transcrição do texto de Eloá 👇🏿👇🏿

Um autor
Eloá Dias Leal Farias

Ele é único
Ele tem sua história
Dando uma oportunidade para nossa Escola
De ter um momento especial
Com imaginação e muita animação
Atividades de criação
E momentos imperdíveis
Você gosta de escrever?
Então venha conhecer
Eduardo Martínez                                                                                                                        Um escritor criativo pra valer!                                                                                                       

  • Nota de escclarecimento: A poeta, jornalista e crítica literária Cecília Baumann escreveu matéria para Notibras no dia 24/10/2024.
  • https://www.notibras.com/site/notibras-desperta-em-alunos-da-rede-publica-interesse-por-literatura/