sábado, 28 de setembro de 2024

Paixão na terceira idade

    

Não que Laureano fosse um completo imbecil, mas os que o conheciam afirmavam que o gajo estava bem perto de se tomar para si o título de mais ingênuo bípede que andava pela disputada praia de Arapuama, na cidade do Cabo de Santo Agostinho-PE. Ele, aliás, que vivera a puberdade na turbulência dos anos 1960, agora gozava a aposentadoria em uma bela casa no famoso balneário. 

          Solteiro por conta da dedicação praticamente exclusiva ao serviço público por quase quarenta anos, caso não fosse a paixão por damas, que lhe tomava o tempo restante em partidas infindáveis com dois amigos, Laureano se aproximava dos 70 anos. Não que o homem não tivesse tido uma vida amorosa, mas nada além de breves romances que se foram com a chegada dos outonos. 

          A residência do velho fazia fronteira com o lar de Gilda, com quem regulava em idade. Viúva, fogosa que nem Gabriela, parece que teve diversão muito além do casamento. E, a despeito do avançar dos anos, mantinha a pele viçosa, talvez por conta de uma receita que aprendera ainda mocinha, cuja compostura deste contador de causos não permite dizer qual. Que a imaginação da leitora ou do leitor tenha a liberdade necessária para supor o que quiser. Afinal, o pensamento é livre!

          Mas voltemos à história, antes que alguém resolva dirigir impropérios à minha pessoa. Então, como ia dizendo, Gilda e Laureano eram vizinhos e desimpedidos, uma combinação fatal para enlace amoroso. É verdade que muito mais pelas intenções da mulher, que fazia reposição hormonal para não perder o rebolado. Quanto ao septuagenário, tudo indicava que estava disposto a trocar as damas pela dama, que, naquele domingo, lhe pareceu muito mais atraente. 

          Não foi preciso convite para cinema ou jantar à luz de velas. Direta que era, Gilda, após uma água de coco num quiosque à beira da praia, segurou a mão de Laureano e o levou para debaixo dos lençóis. Tiveram uma tórrida manhã de amor, isto é, levando-se em conta a idade e condição física do amante. 

          A velha, mais que calejada, poderia ter dispensado o vizinho após a performance, mas não o fez. Nem ela soube explicar o motivo pelo qual ainda quis se relacionar com Laureano. Quer dizer, não soube até o último encontro dos dois. É que, após se amarem, o casal teve o seguinte interlúdio:

          — Gilda, meu amor, acho que estou apaixonado por você.

          — Adoro essa sua maneira de ver a vida, Laureano.

          — Como assim?

          — É que você se ilude de um jeito tão fofo.

  • Nota de esclarecimento: O conto "Paixão na terceira idade" foi publicado por Notibras no dia 28/9/2024.
  • https://www.notibras.com/site/paixao-em-praia-do-cabo-acaba-em-cabo-sem-esperanca/

Nenhum comentário:

Postar um comentário