domingo, 3 de agosto de 2025

Tereza, a mulher que matava cobras

    

Não sei se você já ouviu falar da mulher que matava cobras, que teria vivido no entorno do Distrito Federal, quando tudo por lá ainda era Goiás. Tereza dos Santos. Ou seria da Silva? Que fosse dos Santos da Silva ou mesmo da Silva dos Santos, isso não importa, pois, até onde fui informado, sobrenomes não alteram destinos. Quer dizer, não os da Silva ou dos Santos, tão corriqueiros pelas bandas deste país imenso chamado Brasil, mas que também já foi conhecido por Pindorama.

          Tereza teria nascido no dia 31 de outubro de 1900, último ano do século XIX. O parto, de tão complicado, não poupou sua mãe, que foi enterrada dois dias depois. Sem a mulher para alimentar a recém-nascida, o pai tratou de arranjar uma cabra vermelha. O animal, que era muito apegado à menina, tinha até nome: Bafomé. 

          Aconteceu no aniversário de um ano da pequena Tereza, na presença de Bafomé, que ainda servia de mãe-de-leite. Enquanto a garotinha se divertia com os próprios pés, a cabra sentiu a aproximação de uma jararaca. Para quem visse tal cena, certamente imaginaria que a cabra não estava nem aí para o que pudesse vir a acontecer com a sua filha, ainda mais porque deu dois passos para trás, como se deixasse a serpente passar tranquilamente.

          E lá foi a maldita venenosa. Não tardou, estava a menos de meio palmo de distância da miúda. Esta, assim que percebeu a presença da jararaca, lhe mandou um inocente sorriso quase desprovido de dentes. Não se sabe o que passou pela mente da víbora, pois ela ergueu um terço do corpo e, certeira que nem caçadora experiente, fincou as presas naquelas tenras carnes. 

          Aquilo seria o fim para qualquer bebê, caso não fosse por um porém. Tereza nem pareceu sentir dor, pois, inesperadamente, seu sorriso se transformou em quase gargalhada. Quanto à jararaca, só não levou um tombo porque não tinha pernas. Pois não é que a pobre da cobra, naquele exato instante, partiu para o mundo do além? Difícil de acreditar ou não, foi o que aconteceu. 

          A notícia correu ligeira que nem preá fugindo de gato-do-mato. Como não tinha médico no vilarejo, foi chamado o padre, ainda mais porque os entendidos sabiam que era o mais apropriado. Chegou o vigário, chegou um bando de curiosos. 

        A princípio, perceberam que Tereza não havia sido batizada. O pai da garota foi questionado, mas não havia explicação a dar. Resolveu contar a verdade, que não era nenhuma. Que deixassem a filha em paz e fossem tomar conta das desgraças das próprias vidas. 

          O imbróglio durou quase toda a seca, mas algo não parece ter chamado a atenção de ninguém. É que não houve nem sequer uma vítima de picada de serpente desde o ocorrido. Seja como for, Tereza, o pai e a cabra tiveram que deixar a região até a chegada das chuvas. E foi o que fizeram. 

           Não se sabe se foi coincidência ou coisa do Demônio o que se deu desde então. É que houve uma infestação de jararacas, cascavéis e até surucucu. Toda a pequena população foi picada. Ninguém sobreviveu. 

        Ninguém sabe exatamente o que aconteceu com a pequena Tereza. Alguns afirmam que vive lá pelos lados de Luziânia. Seu pai teria morrido em 1914 ou 1915. Entretanto, por incrível que pareça, Bafomé ainda protege a filha adotiva. Se é verdade ou história inventada, não sou eu que irei desdizer o que me contaram numa roda de fogueira lá pelos lados de Padre Bernardo, pertinho de Brasília. 

  • Nota de esclarecimento: O conto "Tereza, a mulher que matava cobras" foi publicado por Notibras no dia 3/8/2025.
  • https://www.notibras.com/site/tereza-a-bebe-mulher-que-viveu-para-matar-cobras/

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