Em vez da
tão esperada água, o povo viu envelopes de cartas caindo do céu. Sim, inúmeras,
centenas, milhares de correspondências, todas sem remetente e com destinatário
a quem pudesse interessar.
Laura, mãe
de quatro crianças arteiras, não tinha tempo disponível para ler. Mesmo assim,
talvez por curiosidade ou receio de perder oportunidade de algo desconhecido,
tratou de catar um envelope antes mesmo dele cair no chão. Guardou-o no bolso
da saia e retornou para casa, onde havia muita coisa para ser feita naquela
manhã.
Juvenal,
já passado dos 80 anos, viu aquilo como insanidade e, por isso, retornou para
sua residência antes que a loucura o atingisse. Assim que entrou em casa,
passou a chave na porta e cerrou as janelas. Foi só quando tirou o casaco e o
pendurou no gancho preso à parede que percebeu que um sorrateiro envelope havia
se instalado em um dos bolsos.
Juliana e Dionísio, casal que andava às turras por coisas que nem se lembrava,
também pegaram, cada um, um envelope. Intrigados, nem sabiam por que haviam
feito aquilo. Talvez pelo simples motivo de não querer ficar fora de algo que
poderia mudar seus destinos. Mas uma carta? Como um mero pedaço de papel teria
a capacidade de transformar vidas? Bobagem.
Ninguém ficou de fora. Um envelope para
cada um dos quase três mil moradores. Como aquilo era possível? O mais incrível
é que, ao abrirem as missivas, eles constataram que as cartas lhe eram
direcionadas. E nada de mensagens aleatórias, não apenas por dizerem coisas
específicas, mas por citarem os nomes de cada um dos destinatários.
Não se sabe se foi por impulso,
curiosidade ou suspeita de que se tratava de algo grandioso, mas todos
resolveram responder as cartas. E foi o que fizeram e, não se sabe por qual
razão, decidiram colocar todos os envelopes empilhados no meio da única praça da
pequena vila.
Os dias passaram e nada.
Foi aí que o pequeno Francisco, filho da Laura, resolveu contar os envelopes.
Achou estranho, mas talvez tivesse errado na conta. Pediu ajuda à Lúcia, a irmã
mais sábia. Realmente estava faltando uma carta.
Não tardou, as crianças
descobriram que havia sido o velho Juvenal o ausente. Não se sabe se teria sido
por esquecimento ou implicância, o sujeito ainda não tinha aberto o seu
envelope, que continuava no bolso do seu casaco, que ainda estava pendurado no
gancho preso à parede.
Decididos,
Francisco e Lúcia foram bater à porta do antigo morador. Eles questionaram
Juvenal, que achou aquilo uma tremenda baboseira. Seja como for, finalmente
resolveu abrir o tal envelope, leu a mensagem e, impactado com aquelas
palavras, pegou papel e lápis e, compulsivamente, escreveu, escreveu,
escreveu...
Missiva
escrita, lá foram Francisco, Lúcia e o agora animado Juvenal depositarem o
envelope lacrado sobre a pilha dos outros milhares. E todos os moradores se
aproximaram, como se aguardassem algo grandioso acontecer. Aquele mundaréu de
olhos fixos naquelas cartas. Nada. Nada parecia acontecer, até que alguém disse
que aquilo tudo era um completo despropósito.
Quando
a multidão começou a se dispersar, eis que um redemoinho se formou do nada.
Assustada, aquela gente não conseguiu se mover. E o redemoinho, impávido, se
aproximou e se apoderou do monte de cartas e as levou embora.
Boquiabertas, as
pessoas não acreditavam no que haviam acabado de assistir até que as suas faces
começaram a sentir os primeiros pingos de chuva. E, felizes, sorriram.
- Nota de esclarecimento: O conto "A misteriosa chuva de cartas" foi publicado no Notibras no dia 19/12/2025.
- https://www.notibras.com/site/a-misteriosa-chuva-de-cartas/


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