sábado, 12 de abril de 2025

Janaína e Armando

 

          Armando, sonhador irremediável, foi se casar com a Janaína. Pois é, com a Janaína. Justamente a mulher mais racional do bairro. Criatura nascida já com os pés chumbados ao chão. Antes fossem torcedores de times rivais. 

          Não pense você que tal combinação seja de todo mal. Não mesmo! Para você ter ideia, quando o circo pegava fogo, não era o Armando que resolvia a situação. Ao contrário, pois o sujeito entrava em parafuso e ficava incapacitado até de amarrar os cadarços. No entanto, Janaína mantinha a calma e, pensativa, não tardava, encontrava a solução para o problema. Aliás, ela podia até não achar o caminho para dar cabo da pendenga, mas, não tenha dúvida, sabia dizer o que fazer, mesmo que fosse esperar até a poeira baixar. 

          Por sua vez, Armando tinha lá sua utilidade. Isso mesmo! O gajo era responsável por remexer o lodo no fundo do lago onde repousava o matrimônio. Não em busca de novos relacionamentos, mesmo porque se tratava de um romântico inveterado, completo devoto à esposa. 

          Janaína fazia o bolo; Armando, a cobertura; Janaína comprava e embrulhava o presente; Armando dava o toque final com um laço. E assim a vida prosseguia em quase harmonia, ainda mais porque ele dependia dela, enquanto ela apreciava o jeito do marido de olhar o mundo. Alguém até poderia dizer que o casal havia sido arrancado das páginas do romance 'O feijão e o sonho', do imortal Orígenes Lessa. 

          A despeito da harmonia dos pombinhos, não faltam línguas ferinas sem o menor escrúpulo. Uma delas era Julieta, vizinha de porta, que tentava plantar discórdia entre o casal. 

          — Janaína, não sei como é que você aguenta esse tipo molengão.

          — Não tô te entendendo, Julieta. Que molengão é esse que você tá falando?

          — Ué, e por acaso tem outro?

          — Diga logo o que quer dizer, mulher, e pare de rodeio!

          — Armando!

          — E o que tem o meu Armando?

          — Hum! Uma mulher forte que nem você tem que arrumar um homem de verdade.

          — Pois fique você sabendo, Julieta, que, além de homem de verdade, o Armando é o oásis na minha vida repleta de chatices.

          E pode ter certeza de que Armando também ouvia dos amigos falas nada lisonjeiras sobre Janaína.

          — Armando, meu amigo, não sei como você atura isso.

          — Atura o quê, Humberto?

          — Tua mulher!

          — Janaína?

          — E por acaso você tem outra?

          — Não tenho e nem quero! Janaína é o amor da minha vida.

          — É uma mandona!

          — Pois é verdade!

          — Então?

          — Então o quê, Humberto?

          — E você não acha ruim?

          — Ruim o quê, homem?! Eu acho é bom! A Janaína é a minha razão nesta minha vida repleta de devaneios. 

        Não se sabe ao certo quem morreu primeiro, se foi Janaína ou Armando. Dizem até que, já velhinhos, os dois foram dormir juntos e, felizes, acordaram no Reino de Hades. 

  • Nota de esclarecimento: O conto "Janaína e Armando" foi publicado por Notibras no dia 12/4/2025.
  • https://www.notibras.com/site/casal-perfeito-se-completa-em-meio-as-suas-muitas-imperfeicoes/

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