Aos 15, a mocinha resolveu se engraçar para o lado do Reinaldo, o rapazola mais popular da redondeza. Não que fosse mais bonito ou mais inteligente que os demais. Nem mais rico, diga-se de passagem, pois era do tipo que vende o almoço para garantir a janta. No entanto, lábia era o que não lhe faltava.
Completamente fisgada, Sandrinha não tinha cabeça para mais nada além do aconchego dos braços do gajo. Os pais, aflitos, tentaram de tudo, até ameaças de tirá-las do testamento, como se possuíssem bens para tal. Que nada! Assim como todos no local, mal possuíam para comer e vestir. Viviam contando os vinténs para não perderem o tênue crédito na venda da esquina.
Assim que o namorico caiu nos ouvidos dos moradores da rua, foi aquele falatório: "Não tarda, aparece buchuda!", "Daqui a pouco, essa aí cai no mundo!", "Tenho pena, não. Quem procura acha!", "Isso é falta de uma boa surra!", "Essa rapariga nunca me enganou!"
Os pais da Sandrinha, sem terem mais saliva para orientar a filha, chamaram o padre. Não resolveu. Tentaram o pastor, mas logo perceberam as intenções distorcidas do homem. Apelaram para a Dona Clô, renomada na região por conta de vários trabalhos de descarrego. Que nada! Parece que o feitiço do Don Juan era mais anafado.
Tudo parecia perdido quando, numa tardezinha de sexta-feira, eis que a garota, mal entrou em casa, viu a mãe derramada no sofá da sala, chorosa. O pai, defronte à janela, fumava mais um cigarro. Seus olhos, ao longe, não enxergavam solução para aquele caso perdido. A filha, o homem agora tinha certeza, estava perdida no mundo.
Sandrinha, quase na ponta dos pés, foi ter com a mãe. Abraçou-a e, arrependida que estava, jurou que nunca mais iria ter com o Reinaldo. O pai, vendo aquelas duas em pranto, foi se juntar à reunião de soluços e lágrimas.
_ Você quer tomar um chá, minha filha?
_ Quero, sim, mamãe.
Em poucos minutos, a mesa estava posta com chá e torradas amanteigadas. Os três se sentaram e degustaram aquela iguaria maternal. Sandrinha se mostrou realmente arrependida pelos seus últimos atos. Como é que ela se deixou levar por aquela paixão? Não! Aquilo havia de terminar ali mesmo! Acabou e pronto! Nada mais de Reinaldo ou qualquer outro.
Por volta das nove, foi se deitar. Já era mais que hora de uma mocinha estar na cama. O remorso a corroía, ainda mais porque Sandrinha havia percebido o mal que havia proporcionado aos pais e, em especial, à sua doce amada mãezinha. Nunca mais! A lição havia sido aprendida.
Já pela manhã, um sábado ensolarado, a mãe acordou bem cedo e foi preparar o café da manhã. O marido, atraído pelo cheiro de pão quentinho, logo apareceu. Os dois se abraçaram, trocaram beijos e suspiros. O alívio de ter a filha de volta havia trazido conforto ao seio familiar. Sentaram-se à mesa e, enquanto faziam o dejejum, perceberam que Sandrinha continuava dormindo.
A mãe, talvez mais zelosa, levantou-se e foi até o quarto da menina. Abriu a porta bem devagar para não despertar a filha quando, então, não a encontrou. Cama feita, janela aberta. Olhos arregalados, a mulher constatou o inevitável. Os hormônios haviam falado mais alto.
- Nota de esclarecimento: O conto "Paixonite aguda" foi publicado por Notibras no dia 23/1/2024.
- https://www.notibras.com/site/paixonite-aguda-faz-sandrinha-cair-no-mundo/
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