domingo, 29 de maio de 2022

Quem não se comunica se trumbica

    Vitor, renomado engenheiro civil de Brasília, era do tipo que gostava de trabalhar no aconchego do seu amplo escritório, cadeiras acolchoadas, diplomas pregados pelas paredes, que também eram ornadas por réplicas quase perfeitas de quadros famosos, ar condicionado sempre ligado no máximo. Raramente acompanhava a execução das obras, pois era alérgico a cimento, bem como a todos os cheiros desses lugares. 

    Lá estava o Vítor, com uma enorme xícara de café gourmet sobre a mesa, quando o telefone tocou. Ele até tentou não atender, mas, diante de tal insistência, não resistiu. Era o Zé, o mestre de obras com quem trabalhava desde sempre. Ele não poderia ir ao canteiro de obras, pois havia testado positivo para Covid-19. "Que droga!", pensou Vitor. 

    Não teve outro jeito e, então, o engenheiro teve que abandonar o seu delicioso café e se dirigiu até a obra. Assim que chegou, notou que dois pedreiros discutiam sobre como encaixar uma enorme viga de madeira. Por alguns instantes, Vitor, quase atônito com aquilo tudo, apenas observou, até que não aguentou e disse:

    _ Essa viga vai na diagonal.

    _ O quê? - perguntou um dos pedreiros.

    _ Sim, na diagonal.

    _ Dia o quê? - continuou sem entender.

    _ De trevesso! - disse o segundo pedreiro.

    _ Ah, tá! De trevesso! 

  • Nota de esclarecimento: O conto "Quem não se comunica se trumbica" foi publicado pelo Notibras no dia 1/11/2023. 
  • https://www.notibras.com/site/vocabulario-de-engenheiro-deixa-pedreiros-voando/

segunda-feira, 23 de maio de 2022

Dona Irene, Martinha e a televisão

    Houve um tempo, que talvez você que está me lendo agora desconheça, em que as televisões pesavam como botijões. Isto é, quando ainda se podia comprar botijão, já que o preço se tornou proibitivo para muita gente. Todavia, a história que vou lhe contar é sobre televisão e não o abusivo preço do gás de cozinha.

    Pois bem, lá estavam a minha futura sogra (a Martinha) e a Dona Irene, ainda menina, tentando carregar a pesada televisão de um local para outro da sala. De repetente, a minha sogra começou a ter um ataque de riso e, como de costume, fez xixi nas calças. 

    Os meus futuros cunhados (Magrelo e Salete) desandaram a rir por conta daquele líquido amarelado escorrendo pelas pernas da Martinha. Pra quê? A Martinha falou para a minha futura esposa ajudá-la a deixar a televisão no chão. Em seguida, se virou para o Magrelo e a Salete e disse: 

 _ Limpem toda essa porqueira, que vou tomar um banho bem quentinho!

 _ Mas, mãe! - reclamaram os dois.

 _ Deixem de conversa mole! E coloquem a televisão bem ali!

 _ E a Irene? 

 _ Salete, a Irene vai comer biscoito com chocolate quente, pois ela é a minha neném e pronto e acabou. 

sábado, 21 de maio de 2022

Velhas de Copacabana

    Maria Amélia e Maria Amália eram gêmeas há quase um século, bem antes do Nilton Santos desfilar toda a sua elegância alvinegra pelos gramados mundo afora. Maria Amélia havia se casado e, segundo suas próprias palavras, enviuvado graças a Deus. Maria Amália, mais sábia, preferiu degustar todo o banquete que a vida lhe ofereceu.  

    As duas velhas caminharam, como de costume, até as areias de Copacabana, onde estenderam as cangas e abriram as cadeiras. Ora deitavam seus corpos quase nus, se não fossem por aquelas pequenas peças cobrindo suas partes; ora sentavam em frente ao mar, mas sem qualquer preocupação em contar as ondas, que vinham, que iam. Quase distraídas, não perceberam a aproximação da Sarah, conhecida de longa data. 

    _ Olá, meninas! Tomando um solzinho?

    _ Oi, Sarah! Como vai? - Maria Amélia respondeu, enquanto Amália apenas fez um quase imperceptível aceno com a cabeça.

    Conversa vem, conversa vai, a Sarah não parava de falar sobre os últimos amigos que haviam virado defunto. Até que a Maria Amália, já cheia da voz esganiçada da quase amiga, disse:

    _ Que conversa ruim! Vou ali tomar uma coquinha pra arrotar!

  • Nota de esclarecimento: O conto "Velhas de Copacabana" foi publicada pelo Notibras no dia 15/9/2023.
  • https://www.notibras.com/site/beber-uma-coca-vira-fuga-para-esquecer-mortes/
  • O conto "Velhas de Copacabana" faz parte da Antologia "Metamorfose: poesia e evolução", do Projeto Quatro Amigas (@quatroamigas), 2023.

    

sexta-feira, 20 de maio de 2022

Juca e o preço do leite

    Para não restar dúvida, esta história aconteceu na segunda metade de 2022, quando aquele país, cujo nome significa vermelho como brasa, afundava em verde e amarelo. E não foi por falta de tentativas daquele povo, guiado que nem gado, que se pendurava em caminhão, orava para pneu, dizia que vacina era coisa de comunista e, pasmem, acreditava que o nosso lindo planeta, a velha e boa Terra, era plana.

    Juca não era desses que dão o braço a torcer, ainda mais diante da mulher, Solange. Que ele havia feito besteira ao votar no genocida, até ele sabia. No entanto, apesar de já não mais acreditar ser possível a tão propagada promessa de campanha de que todos os brasileiros de bem teriam uma arma, Juca não conseguia admitir para a esposa a burrada feita nas eleições.

    Entediado que estava, Juca se levantou e, já perto da porta, foi questionado por Solange: 

    _ Vai aonde? 

    _ Dar uma volta.

    _ Vou com você. Preciso comprar algumas coisas pra casa.

    Já no mercado, Juca ia empurrando o carrinho. Tentava acompanhar a mulher, que estava muito mais habituada com aquilo. Na verdade, ele nem se lembrava da última vez que havia feito compras.

    _ Juca, pega dois leites ali.

    E lá foi o homem buscar os tais leites quando, de repente, se deparou com o preço. Arregalou os olhos e, pela primeira vez, teceu uma crítica à situação econômica do país:

    _ Tenho que comprar uma vaca e deixar em casa, pois do jeito que está o preço do leite, Deus me livre. 

  • Nota de esclarecimento: O conto "Juca e o preço do leite" foi publicado por Notibras no dia 30/11/2023.
  • https://www.notibras.com/site/pelo-preco-do-leite-melhor-ter-vaca-em-casa/

quarta-feira, 18 de maio de 2022

Beócio, o espertalhão

        

    Beócio nasceu de um casal normal, mas estava longe de receber a atenção dos olhares femininos. Não que fosse disforme de aparência, apesar de nunca ter sido considerado bonito, mas não era tido como feio, aliás, muito feio. Entretanto, além da aparência não tão agradável, o que mais chamava a atenção das pessoas era a sua capacidade de falar bobagens ou, como sua mãe gostava de falar: "Beócio, deixa de bobice!"

   Já adolescente, ouviu pela primeira vez do melhor amigo, o Restolho: "Quem gosta de homem é boiola! Mulher gosta é de dinheiro!" E, assim, Beócio foi formando o seu caráter, digno da extraordinária sociedade brasileira, sempre aliada aos bons costumes. Obviamente que sim! Tanto é que, certa vez, Beócio, ainda sem um pelinho sequer despontando em sua face, saía bem cedo para comprar pão na padaria da esquina, quando avistou uma lindíssima garota de uns vinte e poucos anos, em trajes minúsculos, se despedindo sorridentemente de um homem muito mais velho e, pasmem, até mais feio que ele. O tal homem estava em um carrão conversível! "O Restolho sabe mesmo das coisas!", pensou quase em voz alta.

   Já adulto, Beócio não conseguia se firmar em emprego algum. Não que fossem trabalhos difíceis de serem executados, mas os salários oferecidos nunca iam além de, no máximo, dois salários mínimos. Sem muito estudo, Beócio resolveu montar uma empresa de segurança com o velho amigo, o Restolho, que também nunca havia se dado muito bem com os livros. O nome da empresa: Falcões Detonadores.

    E, graças aos contatos que o pai do Restolho possuía, conseguiram alguns contratos meia-boca com empresas de renome: Birosca do seu Zé, Salão de Beleza da Dirce e Churrasquinho de Gato do Balacobaco. Na primeira, os dois sócios, cada um plantado de um lado da porta do banheiro, observavam se um cliente mais alcoolizado faria xixi nas paredes. Na Dirce, eles ficavam de olho se alguma cliente levava sem querer um frasco ou outro de esmalte. Já no terceiro estabelecimento, Beócio e Restolho tinham a função de fazer cara feia para os clientes que quisessem colocar mais farofa nos espetinhos. 

   No final do mês, a Falcões Detonadores não conseguia angariar muita coisa. No entanto, os dois adoravam a sensação de poder, como se tivessem algum. Encolhiam as barrigas enormes, estufavam os peitos peludos, mexiam repetidamente nos cavanhaques, faziam beicinho, como se estivessem bravos. Tudo, obviamente, os dois haviam aprendido nos excelentes filmes do Steven Seagal, que, injustamente, jamais venceu um Oscar.

    Beócio acabou se casando com Rose, manicure do Salão da Dirce. Restolho juntou os trapos com Meire, moça dali mesmo do bairro. Cada casal teve dois filhos, todos praticamente sustentados pelas esposas, já que os Falcões Detonadores, de fato, jamais alçaram voo. Os sócios, teimosos, continuaram acreditando e, talvez por isso, a amizade continuou firme. Tanto é que os dois, apesar dos protestos das respectivas esposas, votaram em um candidato que prometia armas para todos. 

    Pois é, o tal candidato venceu as eleições, a crise veio que veio e levou a Birosca do seu Zé, o Salão de Beleza da Dirce e o Churrasquinho de Gato do Balacobaco. A Dirce acabou se engraçando por um bonito rapaz mais novo, que criava galinhas caipiras na parte rural em volta da cidade. A Meire pegou os filhos e foi trabalhar na cidade ao lado, onde dizem ter tido sucesso na venda de salgadinhos e docinhos. Já o Beócio e o Restolho continuam juntos, a amizade ainda mais firme. Não conseguiram comprar a tal arma prometida, mas estão cada vez mais convictos de que mulher gosta mesmo é de dinheiro. 

  • Nota de esclarecimento: O conto "Beócio, o espertalhão" foi publicado pelo Notibras no dia 19/01/2023.
  • https://www.notibras.com/site/beocio-o-espertalhao-sabe-do-que-mulher-mais-gosta/  

terça-feira, 17 de maio de 2022

Meu amigo Marco Antônio

   Essa história aconteceu há tantos anos, que nem me lembrava mais, até que o frio aqui em Porto Alegre me pegou de jeito e, talvez, tenha feito o meu cérebro pegar no tranco. É que sou dessas raras pessoas que não suportam nem uma brisa leve, pois o corpo já fica todo arrepiado. Tanto é que gosto de repetir sempre uma frase: "Quem gosta de frio é pinguim ou picolé!"

    Pois bem, lá estava eu no terceiro semestre do curso de jornalismo, sentado bem próximo à porta da sala, quando um rapaz, que eu já conhecia de vista, se sentou e puxou conversa. 

    _ E aí, fez o trabalho?

    _ Fiz. 

    _ Quem está no seu grupo?

    _ Eu fiz sozinho, pois o meu grupo me expulsou.

    _ Quem era do seu grupo?

    _ A Vívian, a Tatiana, a Fabiane e a Angelina.

    _ E você fez?

    _ Não. Também fui expulso do meu grupo.

    _ Quem era do seu grupo?

    _ A Cíntia.

    _ E quem mais?

    _ Só a Cíntia e eu mesmo.

    _ O quê? Como você conseguiu ser expulso de um grupo de apenas duas pessoas?

    _ Pois é...

    _ Coloque o seu nome aqui no meu trabalho. Melhor um grupo de dois que de um.

   E foi assim que conheci o meu grande amigo Marco Antônio, o Kiko, que me fazia rir muito com as imitações do Michael Jackson cantando Billie Jean. Fizemos algumas investidas no campo jornalístico, criamos alguns fanzines e, até, um periódico chamado Catraca. Mas isso é uma outra história, que talvez eu conte um dia.

  • Nota de esclarecimento: A crônica "Meu amigo Marco Antônio" foi publicada por Notibras no dia 12/2/2024.
  • https://www.notibras.com/site/sem-grupo-futuro-reporter-ia-de-voo-solo/

sábado, 14 de maio de 2022

Doutor sim, senhor!!!

   

         Uma das maiores bobagens que considero é alguém querer impor que a palavra doutor só pode ser usada por aqueles indivíduos que possuem doutorado. E, antes que alguém venha aqui tentar atrapalhar o meu raciocínio, deixe-me, por favor, expor as minhas ideias.  Aliás, você vai querer me ouvir ou vai ficar aí repetindo a mesma ladainha que encaixotaram na sua cabeça?

          Pois bem, a palavra doutor vem de uma outra, menor em tamanho, mas tão ou ainda mais importante, que é douto. Você sabe o que é douto? Douto quer dizer sabedoria, conhecimento e mais uma pá de coisas. Então, o que temos até aqui é que doutor veio de douto, não o contrário. 

          Já doutorado, segundo o dicionário, é a graduação de doutor. Ih, me pegou!!! Não exatamente, pois isso é no âmbito acadêmico. Ou seja, não é porque as universidades utilizam a palavra doutor apenas para quem fez doutorado, que não podemos utilizá-la para todos aqueles que possuem vasto conhecimento em qualquer área, seja ela qual for. Isso mesmo!!! Simplesmente porque já existia, muito antes, uma palavrinha chamada douto, que deu origem à outra, que, por sua vez, também pariu uma terceira. 

          Obviamente, há a utilização acadêmica da palavra doutor, que é um título muito difícil de ser conquistado e, naturalmente, deve ser enaltecido. Não estou aqui para falar mal das universidades, já que, sem o conhecimento produzido e repassado por elas, continuaremos a ser uma colônia exportadora de soja até que todo o meio ambiente brasileiro seja degradado, como temos visto, especialmente nos últimos anos. No entanto, cismo em chamar de doutor, por exemplo, um indígena com vastos saberes sobre sua cultura.  

  • Nota de esclarecimento: A crônica "Doutor sim, senhor!!!" foi publicada por Notibras no dia 5/10/2024.
  • https://www.notibras.com/site/quem-tem-sabedoria-tem-tudo-ou-prefere-o-escalpe/

sexta-feira, 13 de maio de 2022

Sérgio, o verdadeiro Don Corleone

          
        Há pessoas que nos fascinam sem nem mesmo conhecê-las. Uma dessas é o Sérgio, que é amigo de um amigo meu, o Cleidson. Pode até parecer que estou tentando inventar algo apenas por falta de assunto, mas lhe garanto que isso realmente aconteceu.

          Pois bem, lá estava o Cleidson me contando algumas situações curiosas da sua vida e, então, começou a falar do Sérgio. Este, segundo o meu amigo, sempre foi fascinado pelo Vito Corleone, patriarca da família de mafiosos do filme "O Poderoso Chefão". Dessa forma, o Sérgio costuma levar ao pé da letra as falas do Marlon Brando: "Um homem que não se dedica à família nunca será um homem de verdade" ou "Não odeie seus inimigos. O ódio atrapalha o raciocínio".

A despeito de tantos ensinamentos do afamado mafioso do cinema, a frase mais emblemática repetida pelo Sérgio nem é uma dessas, mas a dita pelo Michael Corleone, filho do Vito: "Meu pai me ensinou muitas coisas aqui, neste gabinete. Ensinou-me que mantivesse os amigos por perto e os inimigos mais ainda". 

          Gente, não que o Sérgio seja um mafioso de verdade, pois, até onde sei, nunca mandou matar ninguém ou, então, cometeu algum crime diferente daqueles que todos nós, ao longo da nossa existência, também cometemos. Todavia, a aura do Vito Corleone, o Capo di tutti capi, sobrevive no Sérgio. 

          Eu, que não o conheço, sequer vi uma foto do Sérgio, já sofri a marcante influência dele. Sim, isso mesmo! Pois bem, depois das histórias contadas pelo Cleidson, acabei dormindo no sofá da sala, onde tínhamos comido alguns cachorros-quentes.

Acordei sentindo algo gosmento e pegajoso nas costas. Rapidamente, coloquei as mãos e as levei bem pertinho do rosto. Meus dedos estavam completamente vermelhos. Tomei aquele susto. Eu me virei para o lado, certo de que havia uma cabeça de cavalo ali mesmo. Que nada, eu simplesmente havia me deitado sobre o frasco de ketchup. 

  • Nota de esclarecimento: A crônica "Sérgio, o verdadeiro Don Corleone" foi publicada por Notibras no dia 26/9/2024.
  • https://www.notibras.com/site/historia-de-mafioso-causa-susto-com-ketchup/


terça-feira, 10 de maio de 2022

A tal da briba

    Raimundo morava no Rio de Janeiro desde sua juventude, que notadamente havia sido levada por conta dos ralos cabelos brancos, que ainda cismavam em ornar, aqui e acolá, a sua careca lustrosa. Tinha certa dificuldade com a letra "L", costumeiramente intrometida entre o "P" ou o "B", sempre seguida de uma vogal qualquer. Até mesmo um "V" também era agredido como na complicada pronúncia de um "vrido". 

  Inclusive, quando acertava, Raimundo não se fazia entendido por todos, como bem mostra o seguinte acontecimento, ainda gravado na memória de quem estava presente. Sim, isso mesmo, algumas pobres almas viram isso acontecer e, ouso dizer, foi uma delas que me contou.

    _ Dona Alice, olha a briba atrás da senhora.

    _ Bíblia? Que bíblia, Raimundo?

    _ A briba aí!

    Pois é, a Dona Alice não conseguiu enxergar qualquer bíblia por perto, a não ser uma lagartixa caminhando toda serelepe pela parede. Não sei se você sabe, mas lagartixa, lá na terra do Raimundo, é briba mesmo. Aliás, além de inofensiva, a briba traz uma sorte danada para quem a protege!

  • Nota de esclarecimento: O conto "A tal briba" foi publicado por Notibras no dia 2/1/2024.
  • https://www.notibras.com/site/sorte-na-vida-tem-quem-protege-a-briba/

segunda-feira, 9 de maio de 2022

A fofoca e o mundo

    

   Maricota, idosa que nos faz jurar que a eternidade finalmente foi descoberta, era parte, há tempos, da paisagem da enorme janela daquele casebre bem ali na praça central, onde também se localizava a principal igreja da pequena cidade. Difícil passar por tal lugar sem notar a presença enrugada da velha senhora. 

    Aliás, Maricota também captava tudo ao seu redor e, aquilo que não estava ao alcance das suas vistas anuviadas, ela simplesmente vislumbrava. Tanto é que tinha fama de fofoqueira. Tal predicativo era justamente o assunto daqueles dois, que passavam na calçada, quase em frente à casa da longeva. Enquanto um não havia completado 30, o outro quase regulava com a carcomida.

    _ Essa velha tem a língua maior do que a de um tamanduá!    

    _ Talvez você ainda não tenha percebido algo fundamental na história humana, meu rapaz.

   O jovem, calado e com aquela cara desértica de sapiência, aguardava um desfecho para todo aquele suspense, beirando o artístico, do senhor que lhe fazia companhia naquela bela tarde primaveril.

    _ A mola propulsora do mundo é a fofoca! Sem ela, ainda estaríamos nos tempos das cavernas!

  • Nota de esclarecimento: O conto "A fofoca e o mundo" foi publicado pelo Notibras no dia 5/10/2023.
  • https://www.notibras.com/site/tempo-e-patente-e-maricota-tem-idade-de-sobra/

O maior escritor do mundo

 

    A minha grande amiga Grace L escreveu o texto da última capa do meu livro "Despido de ilusões", onde teceu elogios inimagináveis para qualquer escritor. Tanto é que o meu tio, o Marcius, quando leu aquilo, ficou deveras atônito e me disse quase gritando: "Você não é o maior escritor do mundo!" 

    Seja como for, ainda hoje, quando alguém descobre que sou escritor e até já publiquei alguns livros, sempre peço para que ele leia em voz alta as palavras da Grace. Invariavelmente, eu fico de pé, estico todo o corpo, coloco as mãos na cintura e, tenho certeza, até voaria, caso erguesse os braços.

    Pois bem, voltando ao dia do lançamento de "Despido de ilusões", que se deu em uma livraria no Centro do Rio de Janeiro no longínquo ano de 2004. Lá estava o Marcius para prestigiar seu sobrinho preferido, que obviamente sou eu. Como falei, ele ficou muito contrariado com as palavras da Grace e, então, tivemos o seguinte interlúdio:

    _ Que droga é essa? Você não é o maior escritor do mundo!

    _ Não? Então, quem é?

    _ Não sei, mas não é você!

    _ Por que não?

    _ Ué, porque não e pronto!

    _ Hum... Marcius, veja bem, se está escrito, é verdade!


  • Nota de esclarecimento: A crônica "O maior escritor do mundo" foi publicada pelo Notibras em 01/04/2023.
  • https://www.notibras.com/site/vale-o-que-esta-escrito-sobre-quem-e-o-melhor/




domingo, 8 de maio de 2022

O professor e o morcego

   Aqueles que me acompanham, sabem que a Dona Irene, certo dia, resolveu que eu deveria fazer o curso de engenharia agronômica e, portanto, tratei logo de obedecê-la. Pois bem, lá estava eu durante uma aula de construções rurais, quando o professor passa um filme em que um homem, que dormia sentado no chão, escorado pela parede de uma residência bem precária, é atacado por um morcego. O mamífero alado fez um furinho no pescoço do tal dorminhoco e começou a degustar seu sangue como um legítimo discípulo de Drácula. Ou seria o oposto? Na verdade, isso não importa!

   Todos na sala fizeram caras de espanto, aqueles olhares esbugalhados, umas bocas mais abertas que as comportas de Itaipu em dia de muita chuva. Que momento mágico para qualquer professor! Ele se levantou e, calmamente, voltou a se sentar, mas, agora, na mesa bem em frente aos alunos. Um sorriso tomou-lhe toda a face.

    _ Pois é, meus jovens, essas coisas, infelizmente, acontecem ainda no mundo, como bem mostra esse vídeo feito na África.

    Perguntas daqui, perguntas dali. Todos queriam saber mais e mais sobre aquela cena tão impactante. O meu professor percebeu que eu não havia demonstrado muito interesse pelo assunto e, então, me questionou.     

    _ E você não vai dizer nada? 

    Na verdade, não é que eu não tenha achado a cena interessante. O problema é que, apesar de não ser especialista em morcegos, sei algumas coisas sobre o assunto, pois há muitos anos eu já era formado em medicina veterinária. Esse era o problema, eu sabia de algo, que o meu professor não iria gostar de saber naquele momento, justamente na frente de tanta gente. Todavia, ele insistiu, pois, desde a primeira aula, ele soube da minha formação acadêmica e, por isso, gostava de falar que o veterinário havia roubado algumas áreas de atuação do engenheiro agrônomo. 

    _ Vamos lá! Fale algo sobre o vídeo!

    _ Isso é na América Latina e não na África.

    Gente, o meu professor arregalou os olhos com um misto de espanto e fúria e, então, começou a esbravejar.

    _ É na África, sim!!!

    Nem preciso falar que a aula acabou ali mesmo. Ainda tentei conversar com ele, explicar que só existem três espécies de morcegos hematófagos (os tais amiguinhos do Drácula), e todas elas só vivem na América Latina. Até falei os nomes das tais espécies (Desmodus rotundus, Diaemus youngi e Diphylla ecaudata), mas ele não acreditou. Seja como for, na aula seguinte, ele veio conversar comigo e disse que havia pesquisado e, juro que fiquei surpreendido, até me elogiou na frente de todos os meus colegas. A partir daquele dia, ficamos quase amigos, apesar das provocações sobre os tais roubos de parte da atuação do agrônomo pelo veterinário. 

    _ A produção animal era área da agronomia!

    _ Professor, vaca é bicho ou planta?

    _ Bicho!

    _ Ah, então, essa questão está resolvida!

  • Nota de esclarecimento: A crônica "O professor e o morcego" foi publicada por Notibras no dia 22/2/2024.
  • https://www.notibras.com/site/tropeco-no-conhecimento-e-da-bicho-na-aula-de-agronomia/

Dona Irene e o engenheiro agrônomo

    Assim que comecei a namorar a Dona Irene, ela me disse: "Por que a gente não faz outra faculdade?" Pois bem, eu sempre gostei muito de exatas e respondi: "Matemática!" Pra quê? Ela fez uma cara de nojo, como se eu tivesse esmagado uma barata com as mãos. 

   A minha namorada me mostrou uma lista enorme de cursos possíveis e, então, quase me obrigou a escolher engenharia agronômica. A Dona Irene disse que iria tentar educação física. E lá fomos fazer a inscrição pro vestibular. Todavia, ao invés de estudar para a prova, preferimos gastar o nosso tempo namorando. Por sorte ou sei lá o quê, passamos. 

    As aulas começaram e lá íamos os dois para a universidade. A gente se encontrava na hora do almoço. Tudo ia muito bem, até que, antes mesmo de completarmos o primeiro semestre, a Dona Irene me vem com essa: "Dudu, vou largar o curso, pois fui promovida no trabalho e não vou ter tempo para estudar". Aquilo foi um soco na boca do estômago! Mas fazer o quê? 

    _ Acho que vou largar também.

   _ Tá maluco? Depois de tudo que fiz por você? Você vai ser engenheiro agrônomo! Pronto e acabou!!!

Menino da roça

    Todos os dias o menino acordava mais cedo que o Sol. Não importava se o frio estivesse tão frio, ele era arrastado para fora daquela cama puída. Que frio!!! Tão frio, que era capaz até de congelar os dedos quase infantis, apesar da vida demasiadamente calejada. 

    Apertava os tetos das vacas, o leite esguichava no balde aos pés rachados, quase descalços, se não fosse por aquela botina cheia de buracos. Dali, o menino acompanhava o pai, que já estava alimentando os porcos. Depois tratavam das galinhas, remendavam a cerca, cuidavam da horta. 

   Chegava o domingo, o menino rezava para não precisar se levantar tão cedo. Não que fosse muito religioso, mas gostava de ir à igreja, onde podia adormecer por alguns instantes no colo da mãe. 

    _ Pai, por que a gente precisa trabalhar no domingo?

    _ Filho, porco e vaca não vão à missa!

  • Nota de esclarecimento: O texto "Menino da roça" foi publicado pelo Notibras no dia 01/03/2023. Por questões relacionadas à redação do jornal, essa crônica foi levemente alterada para se passar no Distrito Federal.
  • https://www.notibras.com/site/nem-missa-salva-menino-da-roca-de-trabalhar/

sexta-feira, 6 de maio de 2022

Deus, o tigre e o gato

    

    Não sei se você sabe, mas existe uma famosa frase que diz: "Deus criou o gato para que o homem pudesse ter o prazer de acariciar o tigre", Talvez você até conheça esse ditado, já que não é raro encontrá-lo em clínicas veterinárias.  No entanto, vou lhe contar o que aconteceu um dia, há muitos anos, quando eu estava tentando vacinar um gatinho de um cliente.

    Pois bem, lá estava eu trabalhando, quando chegou um jovem casal trazendo um belo bichano no colo. Ele tinha um sugestivo nome: Mingau. Preto e branco, poderia se passar facilmente por um torcedor do Botafogo, ainda mais porque carregava uma estrela solitária na testa. Pensei comigo mesmo que, por conta dessas características, havia uma ligação especial entre nós dois.

    Aquela era a primeira consulta do Mingau, que não possuía mais de dois meses. Orientações daqui, dicas dali, finalmente havia chegado a hora de vacinar aquele montinho de pelos. Que fofura!!! A mulher, toda agarrada ao Mingau, fez questão de colocá-lo na mesa para que eu pudesse lhe aplicar a primeira vacina. Aliás, aquela seria a primeira injeção que o Mingau tomaria na vida. 

    E lá fui eu, todo me achando o mais sábio e competente veterinário da face da Terra, quando, de repente, o Mingau me mostrou os dentes, ao mesmo tempo em que tentou me arranhar com uma das mãos. Quase!!! Foi aí que descobri uma falha de Deus. Ele deveria ter combinado antes com o gato sobre a tal conversa do homem poder acariciar o tigre.

  • Nota de esclarecimento: A crônica "Deus, o tigre e o gato" foi publicada pelo Notibras no dia 25/10/2023.
  • https://www.notibras.com/site/deus-o-tigre-o-gato-e-a-coragem-de-uma-caricia/

    

quinta-feira, 5 de maio de 2022

Copacabana e o Ayrton Senna

   Se tem uma coisa que me incomoda muito em Copacabana é a estátua do Ayrton Senna. Gente, o que esse trambolho tem a ver com Copa? Aliás, o que tem a ver com o Rio de Janeiro? E que não me venham falar que ele é um símbolo do orgulho do esporte brasileiro. Balela!!! 

  Em primeiro lugar, tenho cá as minhas dúvidas se corrida de carro é esporte. Isso não passa de um amontoado de almofadinhas que tenta descobrir quem é que consegue pisar mais fundo no acelerador de um veículo extremamente caro para qualquer bolso que eu e, provavelmente, você conhecemos. 

    Um mais rico que o outro! Tanto é que, quando deram uma chance a alguém de classe não abastada, descobriu-se o maior vencedor de tal atividade. Preciso falar quem é? Tá bom, o nome dele é Lewis Hamilton. Todavia, uma estátua desse dito fenômeno das pistas também não cairia bem no calçadão mais famoso do mundo. 

 Tirem essa coisa vexatória de Copacabana!!! Se querem homenagear alguém, não faltam ícones relacionados à Cidade Maravilhosa: Dona Ivone Lara, Nise da Silveira, Cartola, Vinícius de Moraes. O Rio não precisa do Ayrton Senna! Aliás, querer ligar esse cara ao Rio é pior que aqueles casamentos arranjados, tão típicos nos tempos dos nossos tataravós. 

    Até tenho uma sugestão. Doem esse monumento para São Paulo, que poderá colocá-lo no lugar da estátua do Borba Gato. Vai fazer muito mais sucesso, ainda mais porque o Senna até ganhou o meu respeito nos últimos tempos, já que é o contraponto daquele outro, que arrumou emprego de motorista do Bozo, o palhaço, além de esconder coisinhas surrupiadas de um certo palácio, que não é o de Buckingham. Só não mexam com os Dois Candangos!

  • Nota de esclarecimento: O texto "Copacabana e o Ayrton Senna" foi publicado pelo Notibras no dia 09/05/2023.
  • https://www.notibras.com/site/tirem-borba-levem-senna-e-deixem-candangos/

quarta-feira, 4 de maio de 2022

Dona Irene e o Nando Viana

           Talvez vo/cê, que está me lendo agora, não saiba quem é o Nando Viana, comediante do programa "A Culpa é do Cabral". No entanto, certamente conhece a minha amada, a famosa e incrível Dona Irene. Pois bem, a história de hoje é sobre o dia em que o Nando teve a sorte de encontrar a minha mulher em um dos aeroportos espalhados pelo Brasil. 

          Lá estava a Dona Irene confortavelmente sentada numa cadeira à espera do seu voo, quando percebeu um olhar curioso em sua direção. Por sorte, ela sabia de quem eram aqueles olhos puxados, haja vista acompanhar as peripécias do tal programa do Comedy Central.  O Nando sorriu aquele sorriso tímido de um fã que quer se aproximar, enquanto a minha mulher sorriu aquele sorriso cativante que só ela tem. 

          Para falar a verdade, nem sei se essa história se passou da forma que a estou escrevendo. Todavia, prefiro pensar que ela tenha acontecido assim. Seja como for, a Dona Irene e o Nando acabaram tirando uma fotografia juntos. Aliás, isso só prova que esse rapaz, que é de Esteio-RS, é mesmo um cara de sorte!

  • Nota de esclarecimento: A crônica "Dona Irene e o Nando Viana" foi publicado por Notibras no dia .
  • https://www.notibras.com/site/encontro-casual-de-fas-da-mais-brilho-a-aeroporto/

segunda-feira, 2 de maio de 2022

Dona Irene no Beira-Rio

    Não faz muito tempo, a minha esposa (a Dona Irene), a minha filha (a Ninica) e eu fomos convidados pela Soraia e o seu pai (o Jesus) para assistir a um jogo do Internacional no Beira-Rio. Só para situar você que está me lendo, a minha mulher é palmeirense dessas bem chatas, a Ninica é botafoguense, a Soraia e o Jesus são mesmo Internacional. Eu? Ah, um dia fui torcedor do Botafogo, mas a Dona Irene me intimou a torcer pro Palmeiras desde os longínquos tempos de namoro. 

  E lá estávamos os cinco sentadinhos lado a lado naquele estádio lindo, cheio de torcedores mais vermelhos que tomates bem maduros. Ah, eu não visto uma camisa de time há décadas, desde os meus tempos de menino, quando a camisa 8 do Botafogo era a minha segunda pele e, assim, ainda corria atrás de uma bola. Por isso, eu era o único que não empunhava o tal manto sagrado colorado. Seja como for, entre uma jogada e outra lá dentro do campo, surgiu um interlúdio curioso entre a Ninica e a minha amada ali nas cadeiras.

   _ Ué, você virou torcedora do Internacional?

   _ Claro que não! Só que acho uma bobagem não vestir a camisa de outro time. Aliás, quando vestimos a blusa de outro time, desestimulamos a violência no futebol.

   _ Ah, é? Então, vou te dar uma camisa do Corinthians.

   _ Tá maluca? Sai fora!!!

   

Santana e a pança

    Lá estava o Santana, cada vez mais incomodado com a sua enorme pança, cada vez mais presente na sua cintura. O cos das calças, cada vez mais baixo, fazia com que a banha tombasse sem qualquer cerimônia sobre a virilha, cada vez mais escondida. "Que droga!", ele dizia para si mesmo.     

    Ele tentava se lembrar do tempo em que ainda podia tirar a camisa na praia sem sentir vergonha. Não que algum dia ele tenha tido um corpo apolíneo. Longe disso! No entanto, naquela época tão longínqua, isso não o incomodava. "Que droga!", o Santana não conseguia deixar de pensar no seu volumoso abdome, fruto do puro desleixo de anos, regado a litros e mais litros de chope, churrascos com aquelas bordas generosas de gordura, vários docinhos aqui, outro tanto de salgadinhos ali. 

    Assim que ele entrou na delegacia, alguém lhe pediu para tirar fotografias de um preso, que estava lá na cela ao fundo. Cheio daquele seu mau humor tão característico, lá foi o Santana cumprir a sua primeira tarefa do dia. 

    _ Ei, levanta aí, que preciso tirar umas fotos suas.

   O homem, que havia sido autuado por embriaguez ao volante, talvez ainda estivesse sob efeito de álcool. Tanto é que ele se levantou de forma meio sonolenta, sorriu para o Santana e, num movimento meio inesperado, retirou a camisa e começou a fazer pose de fisiculturista. 

    _ Tá bom assim? 

    O Santana, com a máquina fotográfica nas mãos, não conseguia deixar de pensar que aquele preso, bem ali naquela cela fria e imunda, tinha o abdome que ele queria para si. "Que droga!!!", quase pensou alto.

  • Nota de esclarecimento: O conto "Santana e a pança" foi publicado por Notibras no dia 21/2/2024.
  • https://www.notibras.com/site/fisiculturista-preso-provoca-inveja-em-delegacia/

Como estragar o dia de um corintiano

    Aqueles que me conhecem sabem que sou casado com a Dona Irene, que é a mais fanática torcedora do Palmeiras. No entanto, apesar dela ser uma palmeirense muito chata, ela consegue admirar pessoas em várias áreas, independentemente das paixões clubistas. Um desses casos é o Casagrande, famoso por ter feito muito sucesso em vários times, especialmente no Corinthians. 

    Pois bem, lá estávamos a minha amada e eu, no aeroporto de Congonhas, aguardando o nosso voo para o Santos Dumont, quando ela avista o Casagrande. Aliás, o cara faz jus ao nome, pois é realmente enorme, beirando 1,90 m ou mais. A Dona Irene ficou com muita vontade de bater uma foto ao lado do antigo jogador, mas eu falei para ela não fazer isso, pois havia uma outra mulher, bem ali perto, que estava trocando olhares e sorrisos com ele. Isso como se a Dona Irene prestasse atenção nas coisas que falo. 

    Como já era esperado, a minha mulher não quis nem saber se estava rolando um flerte ou namorico entre os dois pombinhos. Ela simplesmente chegou no Casagrande e perguntou se podia tirar uma foto com ele. Obviamente, muito educado que o Casão é, disse que sim. Isso fez com que a então quase namorada dele se levantasse e fosse embora, não sem antes lançar um olhar de "Você vai se ver comigo, sua vaca!" para a minha esposa.

    A Dona Irene se sentou ao lado do Casagrande e os dois trocaram algumas palavras:

    _ Eu sou palmeirense!

    _ Percebi! - disse ele, apontando para o casaco da minha mulher.

    Tirei a tal foto dos dois e, então, a minha mulher se despediu do Casagrande, que abriu aquele sorriso tímido que todos conhecemos. Assim que nos afastamos um pouco, falei para a minha mulher que ela havia estragado o romance entre o Casagrande e aquela mulher. Pra quê? A Dona Irene olhou para mim com aquele olhar tão dela e disse: "Ah, eu gosto do Casagrande! Mas quem mandou ele torcer pro Corinhians?"

  • Nota de esclarecimento: A crônica "Como estragar o dia de um corintiano" foi publicada pelo Notibras no dia 09/08/2023.
  • https://www.notibras.com/site/aula-de-como-estragar-o-dia-de-um-corintiano/

  

domingo, 1 de maio de 2022

A lava-louças da minha amiga

          Não faz muito tempo, reencontrei a minha grande amiga Tania, que fez medicina veterinária comigo na Rural (UFRRJ). Desde 2003, ela mora em Porto Alegre, a mesma cidade em que a minha mulher (a Dona Irene) e eu residimos, apesar de, vez ou outra, irmos para a minha cidade natal (Rio) ou, então, para Brasília. 

          Pois bem, em meados de 2022, a Tania nos convidou para um churrasco, especialmente preparado pelo seu marido, o Milton. Aliás, pelo simples fato de sabermos que o Milton é gaúcho, já saímos de casa certos de que a carne seria extremamente gostosa! E estava mesmo!!! Churrasco de gaúcho, como a Dona Irene costuma falar, é outro nível.

          Os assuntos foram diversos, transitou pela situação cada vez mais caótica que o país vivenciava desde o Golpe contra a Dilma, passou por futebol, ganhou contornos de esperança de medalhas olímpicas no futuro, haja vista a Ana Sofia, de 11 anos, filha da Tania e do Milton, ser uma grande judoca.

Tudo isso era acompanhado pelos olhos curiosos do Lupicínio, o lindo buldogue francês da minha amiga. Já a gata Frida, mais tímida, apenas passou pela sala e foi se recolher em seus aposentos.

          Quando acabamos de comer, eu me prontifiquei a lavar a louça, mas sem avisar a Tania. Ela, assim que me viu com a esponja na mão, quase me deu uma bronca.

A minha amiga falou que possuía uma lava-louças, que estava bem ali embaixo da pia. Ela começou a elogiar esse eletrodoméstico, disse que foi a melhor coisa que havia comprado. Então, a Tania se virou para a Dona Irene e perguntou:

          — Qual é a marca da sua lava-louças?

          — Dudu!

  • Nota de esclarecimento: A crônica "A lava-louças da minha amiga" foi publicada por Notibras no dia 14/10/2024.
  • https://www.notibras.com/site/a-lava-loucas-da-minha-amiga-e-um-velho-amigo/